Leandro E. G. Ferreira, Facebook.
Uma das mais importantes decisões tomadas pelo Tribunal Constitucional de Angola desde a sua institucionalização é, inequivocamente, o acórdão 111/2010 (em geral desconhecido pelos cidadãos, não obstante ter definido, provavelmente de forma absoluta, os destinos do país nos anos seguintes).
Ao contrário da sua posição regularmente invisível no sistema constitucional de exercício dos poderes públicos, que cria uma impressão generalizada de importância bastante diminuta, o TC apresentou uma diferente visão, demonstrando a relevância fundamental do Vice-Presidente da República, em especial na articulação dos processos de substituição do PR, temporária e definitiva.
O acórdão censurou a hipótese de existirem quaisquer mecanismos que permitam a cidadãos assumirem a função de Presidente da República sem que tenham sido sujeitos a escrutínio popular especificamente para esse propósito (ou expectável propósito), em função do limite material do sufrágio directo, previsto na LC n.º 23/92 e que se mantém no texto constitucional até hoje. Esta é a expressão e representação da importância fundamental de um VPR, enquanto gigante adormecido, com susceptibilidade de assumir a direcção dos destinos do país.
Em geral, os artigos 132.º e 132.º-A agora propostos à revisão constitucional mantêm o problema já antes identificado no artigo 132.º em vigor (designação pelo partido de outros membros da mesma lista). Possivelmente por desatenção, a disposição não mereceu a mesma censura da parte do Tribunal Constitucional em 2010, mas em total desalinhamento com os fundamentos pelos quais declarou a inconstitucionalidade da alínea a) do artigo 119.º da versão inicial da CRA aprovada pela Assembleia Constituinte (não eleição directa de quem assume a função de Presidente da República). O TC ordenou a supressão de tal disposição e impôs a designação dos dois concorrentes a PR e VPR nos primeiros lugares da lista concorrente ao círculo nacional, bem como a identificação directa com foto do concorrente a PR no boletim de voto.
Tanto para o caso de substituição do Presidente da República, como do Vice-Presidente, foi ponto assente naquela decisão que qualquer cidadão só pode vir a tornar-se Presidente da República se, em algum momento, tiver sido designado num dos primeiros dois lugares da lista do partido político vencedor das eleições gerais no círculo nacional (a única via que permite o exercício directo do sufrágio). Não tendo sido esta a situação, a solução deve necessariamente consistir em antecipação das eleições, tal como prevê já o n.º 3 do do actual artigo 132.º, CRA em caso de impedimento definitivo simultâneos no decurso do mandato. A proposta deve igualar, portanto e a meu ver, o impedimento definitivo antes da tomada de posse e no exercício de funções, não havendo razões objectivas para a diferenciação que agora se pretende.
Essa solução deve impor-se, por razões óbvias, aos casos de “posição de trânsito”, devendo considerar-se a decisão do TC extensível às situações de trânsito Lista-VPR-PR, considerando a falta de legitimação popular, ainda que o designado se encontre em tempo significativo na função de VPR.
Do mesmo modo, não se encontram resolvidos os problemas referentes à contagem, comunicabilidade e limitação de mandatos existente na aplicação remissiva das regras do PR ao VPR (n.º 4, artigo 131.º), situação que é reflexa e intimamente ligada ao problema da substituição por impedimento definitivo, pois podem colocar-se especiais dificuldades de contagem e limitação dos mandatos no desempenho do segundo turno.
O VPR, a quem se aplica o regime do PR, está condicionado em todo o topo do Executivo ou apenas em relação ao seu estatuto, quando se trata de limitação de mandatos?
O regime proposto para revisão continua a não responder a isso satisfatoriamente, mesmo tendo tocado numa norma reflexa.
É, como se vê, um gigante adormecido!
Leandro Ferreira, Facebook
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