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O “novo” direito surgido no espaço: Breves considerações

Onésimo Amarildo Afonso Victor[1]

RESUMO

O presente artigo científico abordará sobre O “novo” Direito surgido no Espaço: Breves Considerações. Tem-se como finalidade compreender o surgimento e evolução do Direito Espacial. Propõe-se demonstrar as implicações jurídicas do surgimento deste ramo de Direito. Ainda assim, expor os principais fundamentos da existência deste ramo de Direito. E por fim, apresentar os instrumentos jurídicos essenciais que constituem o Direito Espacial. Para se alcançar os objectivos deste trabalho, optou-se pelo método qualitativo e para melhor compreensão e sustentabilidade do estudo utiliza-se a pesquisa bibliográfica e documental, analisando a origem e percurso do Direito Espacial e as principais ideias de diversos autores. A partir disso, conclui-se no trabalho que o Direito Espacial é uma disciplina jurídica baseada na paz, segurança e bem comum de toda a humanidade, uma vez que surge no auge da Guerra Fria entre os EUA e a ex-URSS que protagonizaram uma corrida espacial bipolar. Em suma, procura-se contribuir para a ciência jurídico espacial sobretudo para a academia lusófona os principais fundamentos.

Palavras-chave: Direito Espacial. Guerra Fria. Direito Internacional Público.

ABSTRACT

This scientific article will address the “new” Law that emerged in Space: Brief Considerations. Its purpose is to understand the emergence and evolution of Space Law. It is proposed to demonstrate the legal implications of the emergence of this branch of law. Still, expose the main foundations of the existence of this branch of Law. And finally, to present the essential legal instruments that constitute Space Law. In order to achieve the objectives of this work, the qualitative method was chosen and for better understanding and sustainability of the study, bibliographic and documentary research is used, analyzing the origin and trajectory of Space Law and the main ideas of several authors. From this, it is concluded in the work that Space Law is a legal discipline based on peace, security, and a common good of all humanity, since it appears at the height of the Cold War between the USA and the former USSR that led a bipolar space race. In short, we seek to contribute to the legal science of space, especially for the Portuguese-speaking academy, the main fundamentals.

Keywords: Space Law. Cold War. International Public Law.

Créditos: ISPI Online

INTRODUÇÃO

“As coisas apenas são impossíveis até que alguém as torne possíveis.”

Nelson Mandela

Há anos que os latinos nos seus ensinamentos clássicos diziam “ubi homo, ibi societas; ubi societas, ibi ius”[2], que significa dizer: “onde estiver o Homem haverá sociedade e onde estiver a sociedade existirá o Direito”. Portanto, pretende-se aferir que o Direito sempre acompanhará o Homem. O que não se imaginava é que o Direito acompanharia o Homem fora do planeta Terra. Vale salientar que a justiça e a paz social são uns dos valores que o Direito procura garantir para que se torne possível a convivência humana.

Dito de outro modo, julgava-se que o brocardo supramencionado somente fosse possível aplicá-lo no planeta Terra. Mas, de igual modo, é possível ser aplicado fora da Terra. Pois, dos vários ramos de Direito existentes os seus objectos de estudos encontram-se no nosso planeta Terra. Porém, há um ramo de Direito cujo seu objecto encontra-se fora da Terra.

O ramo de Direito que se propõe a abordar é o Direito Espacial. Este ramo de Direito não é propriamente novo, pois ele já possui sessenta e quatro (64) anos de existência. Ora, desde aquela data nunca sofreu alteração nos seus instrumentos jurídicos.

Logo, a abordagem do presente artigo basear-se-á neste novo ramo surgido fora do planeta Terra. Este ramo de Direito que se propõe abordar é bastante técnico e complexo. Todavia, caro leitor, procuramos ser mais simples possível para sua compreensão. Desta feita, o nosso trabalho está estruturado da seguinte forma:

No primeiro segmento, fez-se uma incursão histórica da evolução do Direito Espacial, sobretudo da rivalidade ideológica que existia entre as potências mundiais que mais tarde transformou-se em rivalidade tecnológica armamentista e científica.

No segundo segmento, por seu turno, procurou-se o contributo de vários autores sobre a noção deste ramo de Direito, o Direito Espacial.

No terceiro segmento, abordou-se sobre as preocupações que os juristas na época tinham, aquando do lançamento do primeiro satélite artificial, o Sputnik I. Eles preocupavam-se com a designação a ser concedida a este ramo de Direito.

No final, no quarto segmento, tratamos sobre os objectivos essenciais dos cinco tratados internacionais do Direito Espacial.

  1. Breves Considerações Históricas

O Homem sempre ficou admirado, desde a época antiga, com a beleza das estrelas, das fases da Lua, do brilho do Sol e demais Corpos Celestes. Mas, foi a partir da consolidificação, feitas pelos gregos, sobre os estudos da astronomia que os corpos celestes começaram a ser analisado a sua movimentação[3].

Sendo assim, surge a teoria geocêntrica elaborada pelo grego Claúdio Ptolomeu. A teoria em referência sustentava a ideia de que a Terra era o centro do Universo e os demais corpos celestes giravam ao seu redor[4].

Porém, aquela teoria foi discordada pelo Nicolau Copérnico. Este autor defendia a ideia de que a trajectória da Terra era feita ao redor do eixo do Sol, situado no centro do Universo. Este fundamento foi designado como: a teoria heliocêntrica[5]. Assim, foram surgindo vários cientistas contribuindo para o estudo da astronomia e a realização do sonho de chegar a Lua.

Na verdade, o auge do estudo da astronomia começa no final da 2ª Grande Guerra Mundial (1939-1945). A não proibição da produção de foguetes, na época, era a lacuna que apresentava o Tratado de Versalhes, de 1919. Sendo assim, a indústria alemã que apresentava ao mundo a “Luftwaffe-Blitzkrieg”[6], virou às suas atenções a produção de foguetes V-2, designado como “Vergeltungswaffe.2”, que significa arma da vingança. Considerado como o primeiro míssil balístico mundial[7].

A produção daquele foguete, foi feito pela empresa: Sociedade para Viagens Espaciais[8]. O principal rosto desta empresa foi o Wernher von Braun[9] dedicado as viagens ao espaço. Esta empresa desenvolveu vários programas militares para Alemanha Nazi. Além disso, a produção do foguete V-2, não mudou o rumo da guerra, porém deixou impacto na sua utilização, isto é, destruindo muitos países Aliados, sobretudo na cidade de Londres[10].

Com o fim da guerra e o fracasso da Alemanha Nazi, as duas potências mundiais (os norte-americanos e os soviéticos) estavam muito interessados em capturar o engenheiro Wernher von Braun e sua equipe devido aplicação dos seus conhecimentos no foguete V-2 que causou grandes danos[11].

Entretanto, os cientistas alemães, ora citados, decidiram entregar-se ao exército norte-americanos, pois entendiam que eles tinham melhores condições para implementação das viagens ao espaço[12].

Ora, os soviéticos, perdendo a captura daquele engenheiro como principal alvo, tiveram como “prémio de consolação”, os fragmentos do foguete V-2 e alguns cientistas alemão. Estes cientistas juntamente com o Sergei Korolev, cientista, tinham como tarefa melhorar os programas de foguetes e missões soviéticas[13].

Os EUA[14] e a ex-URSS[15] lançam-se, impetuosos, à corrida ao espaço cósmico na criação do primeiro míssil balístico intercontinental. O objectivo de ambos era tornar-se a primeira potência espacial do mundo. Assim, o espaço tornou-se num novo palco para a exibição de prestígio nacional e poderio.

Portanto, os EUA e a ex-URSS demonstravam suas lideranças para outras nações fazendo a guerra da propaganda, ostentando sua superioridade tecnológica e militar, expondo a grandeza e a excelência inerentes aos seus respectivos regimes, o liberal democrático e o comunista[16].

Face a isso, surgiu, então, a corrida bipolar ao espaço naquela época. Diz-se corrida bipolar porque foi protagonizada pelas duas potências mundiais.

Ao longo dos tempos, tornava-se cada vez mais uma realidade em colocar um objecto fora da Terra. Pois, em Julho 1957, o Conselho Internacional de Uniões Científicas[17] contribuiu, para tal, realizando um evento internacional designado como: o Ano Geofísico Internacional. O objectivo fundamental era de concentrar os estudos científicos para compreender melhor a interação dos astros do Sistema Solar.

Na perspectiva de Stephen Doyle, aquele evento internacional visava à coleta de dados acerca das propriedades físicas da Terra e de suas interações com o Sol, a fim de obter-se uma visão planetária em relação ao tempo, ao geomagnetismo, à ionosfera, à aurora, dentre outros elementos[18].

Face esse contexto, a ex-URSS fez história colocando em órbita da Terra o primeiro satélite artificial, o Sputnik 1, em 4 de Outubro de 1957, na base soviética de Baikonur, no Cazaquistão[19].

Ora, os norte-americanos não queriam ficar para atrás. Foi, então, que a 31 de Janeiro de 1958, lançaram o satélite artificial Alpha, designado como: Explorer 1.

A seguir, apresentar-se-á, em síntese, as contribuições de vários autores sobre a noção do Direito Espacial.

2. Noções Gerais Sobre Direito Espacial

À mercê dos ensinamentos de José Filho compreende que o Direito Espacial pode ser definido, pois, como um novo ramo do Direito Internacional Público criado para estabelecer o regime jurídico específico do espaço exterior e dos corpos celestes e ordenar as actividades exercidas pelos seres humanos no novo meio[20].

Há autores que entendem que o Direito Espacial é o ramo de Direito Internacional Público que regula as actividades dos Estados, através de suas empresas públicas e privadas, bem como das organizações internacionais intergovernamentais, na exploração e uso do espaço exterior, e estabelece o regime jurídico do espaço exterior e dos corpos celestes.

Continue a ler o artigo no ficheiro abaixo:


[1] Advogado Estagiário, Licenciado em Direito pelo Instituto Superior Politécnico (IMETRO).

[2] Fernando OLIVEIRA, Glossário de Latim para Juristas, 2012, pág. 139

[3] Jean-Pierre VERDET, Uma história da astronomia. Tradução de Fernando Py. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1991, pág. 14-18.

[4] Idem, pág. 14-18.

[5] Fátima Regina Rodrigues ÉVORA, A revolução copernicana-galileana, Campinas: UNICAMP, Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência, 1988, pág. 34.

[6] Foi ramo aéreo da wehmacht que, durante a Alemanha Nazi, era atribuída a tarefa de missões aéreas internas e externas através de uma tática militar que consiste em ataques rápidos e de surpresa pelo poder aéreo cuja finalidade é evitar que as forças inimigas tenham tempo de organização de defesa. In Aspirante de Cavalaria Fábio Emanuel Soares ALMEIDA, As Divisões Panzer na 2ª Guerra Mundial nas Campanhas das Ardenas (1940 e 1944-45), Academia Militar, Lisboa, 2014, pág. 8.

[7] Othon Cabo WINTER; Cristiano Fiorilo de MELO, In: Othon Cabo WINTER, António Fernando Bertachini de Almeida PRADO (orgs.), A Conquista do Espaço: do Sputnik à Missão Centenário. 1. ed. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2007, pág. 17.

[8]  Designado em alemão como: “Verein für Raumschiffahrt”

[9] Engenheiro alemão dedicado as viagens ao espaço que se inspirava na ideia de Júlio Verne, Konstantin Tsiolkovsky.

[10] Von HARDESTY & Gene EISMAN, Epic Rivalry – the inside story of the Soviet and American space race. Washington, D.C., EUA: National Geographic, 2007, pág. 3.

[11] Idem, pág.4.

[12] Idem pág.4.

[13] Idem, pág.5.

[14] Estados Unidos da América.

[15] Ex-União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

[16] José Mosserat FILHO, & A. Patrício SALIN, Direito Espacial e as hegemonias mundiais, 2003, pág. 262.

[17] Sigla em inglês ICSU – International Council of Scientific Unions.

[18] Stephen E. DOYLE, The international geophysical year: initiating international scientific space cooperation, Paris: International Astronautical Federation (IAF), 2012, pág.16.

[19] Jefreson DE CAMPOS, Direito Espacial: a regulamentação do Direito Espacial, 2018, pág.3, disponível em https://juridicocerto.com/p/jefersson-de-campos/artigos/direito-espacial-a-regulamentacao-do-direito-no-espaco-sideral-4237. Data de Acesso: 23/05/2019.

[20]José Monserrat FILHO, Pioneiros do Direito Espacial, disponível em http://www.sbda.org.br/artigos/99.htm. Data de acesso: 11/12/2020.

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