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Os Efeitos da Greve dos Taxistas nos Trabalhadores do Sector Privado

Artigo de opinião 004/2022

Os Efeitos da Greve dos Taxistas nos Trabalhadores do Sector Privado

Notas introdutórias

O trabalho é, além de um direito, um aspecto que complementa o Homem, sendo que é por via deste que o mesmo consegue se sustentar a si e à sua família. O contexto actual mostra grandes índices de desemprego, tal situação que faz com que todos queiram acautelar os seus postos de trabalhos, evitando faltas e justificando sempre que forem faltar. Porém, existem situações supervenientes cuja que, fruto da sua imprevisibilidade, impossibilitam o trabalhador de dar a conhecer a entidade empregadora sobre a sua ausência no local de trabalho.

Datam dias em que os taxistas alarmaram uma greve no seio das suas actividades reivindicando alguns direitos que são dados como extremamente importantes para a classe. Tal acto teve grande repercussão a nível da cidade capital e, como consequência, muita gente viu-se impossibilidade de chegar aos seus postos de trabalho.

Neste artigo de opinião abordamos de forma resumida sobre “Os efeitos da greve dos taxistas nos trabalhadores do sector privado”.

Vamos focar o centro da abordagem para os trabalhadores do sector privado que são abrangidos pela Lei Geral do Trabalho, doravante LGT.

Contexto

Angola é um país onde a mobilidade de pessoas e bens ainda é um grande problema, sendo que boa parte da população não tem meios particulares para a sua mobilidade ou deslocação, de tal sorte que os deixa em desvantagens e totalmente dependentes dos transportes públicos. O Estado, por si só, através do Ministério dos Transportes, não tem conseguido dar resposta a este problema. Esta situação tem maior acentuação em Luanda que, segundo dados do Censo 2014, é a “província mais populosa, representando 27,3% dos mais de 30 milhões de angolanos residentes e estimava-se que até 2019 Luanda teria cerca de 8,2 milhões de habitantes”  CITATION Jor19 l 1046 (Jornal Expansão, 2019).

Os transportes públicos em Luanda são insuficientes em função da demanda e das necessidades. Vezes há que por conta desta insuficiência notamos a sobrelotação nos autocarros o que é deplorável, principalmente numa altura em que vivemos uma situação de calamidade por conta do vírus da COVID-19 que vem sendo destaque mundial e recentemente com a nova variante, a Ômicron, pois, não se respeita a principal forma de evitar a transmissão do mesmo que é o distanciamento físico.

Sendo a economia angolana de mercado e o nosso sistema capitalista, tal como é frisado no preâmbulo e nos artigos 14.°, 37.°, 38.° e 89.° da Constituição da República de Angola, doravante CRA, os particulares podem ter as suas propriedades privadas e, dentro dos limites impostos pela Constituição e a lei, prosseguir fins privados. Neste sentido, há particulares que fazem investimento nos ditos “candongueiros” vulgo “azul e branco” o que já mitiga de maneira bem significativa a impossibilidade que determinados sujeitos têm para se deslocar, e mais, se deslocar com uma melhor segurança e conforto.

Esses candongueiros vêm colmatar a grande lacuna deixada pelo Estado no seu dever de garantir condições de mobilidade por meio dos transportes públicos. E com o passar do tempo, foram ganhando grande espaço em razão do serviço de interesse público que prestam, tornando-se grandes parceiros do Estado. Com a dinâmica social, os taxistas, que fazem o serviço de táxi com os candongueiros, viram-se na necessidade de organizarem-se do ponto de vista legal, ou seja, terem personalidade jurídica, foi assim que surgiram as diversas Associações de taxistas como a ANATA (Associação Nacional de Taxistas de Angola), ATA (Associação dos Taxistas de Angola) entre outras, com vista a lutar pelos seus direitos de maneira bem mais formalizada.

O desenrolar da relação entre o Estado e os taxistas foi tendo as suas vicissitudes, a mais recente são as exigências que estes fazem, das quais destacam-se: a não materialização até agora da profissionalização da actividade e da carteira profissional; violação dos direitos económicos e sociais; discriminação no cumprimento do decreto sobre o Estado de calamidade pública entre táxis e autocarros (situação já resolvida); a exclusão dos taxistas nas políticas públicas e o mau estado das vias. O não atendimento dessas exigências culminaram em decretação de greve de 3 dias, começado no passado dia 10 de Janeiro de 2022.

Por ser extremamente importante a existência dos taxistas para a mobilidade das pessoas e bens, tal acto, que consistiu na paralização dos serviços de táxi, teve grandes efeitos a nível de toda a cidade de Luanda, sendo que muitas pessoas tiveram que andar longas distâncias para poderem chegar aos seus locais de trabalho, outras tiveram que recorrer aos mototaxistas (como meio alternativo) e muitos desses se aproveitaram da situação para fazerem linhas curtas e aumentar os preços das rotas, e até mesmo outras pessoas não conseguiram ir trabalhar por causa desta situação, o que abrangeu de modo negativo trabalhadores de várias profissões, principalmente os do Sector Privado.

Para as pessoas que não conseguiram ir trabalhar, de certeza que levaram falta no seu local de trabalho. Será que “a greve dos taxistas é motivo suficiente para justificar a falta no local de trabalho”? Pois, são perguntas como esta que nos propusemos a dar a nosso entendimento.

Análise da problemática

O Direito à greve é um Direito Social, pode ser entendido como a suspensão temporária do trabalho que tem como causa interesse (social) dos trabalhadores. A CRA reconhece o Direito à Greve no n.°1 do artigo 51.°. Este direito vem tratado de forma mais complexa na Lei n.°23/91 de 15 de Junho, Lei da Greve. Fazer referência que é uma Lei anterior à CRA, mas que já se encontra em Revisão. Trata-se de um direito expansivo para todos os trabalhadores desde que queiram aderir à greve, pois ninguém é obrigado (artigo 4.° da Lei da Greve).

Esta Lei traz uma noção de greve no seu artigo 2.° conceituando-a como “(…) a recusa colectiva, total ou parcial, concertada e temporária de prestação de trabalho, contínua ou interpolada, por parte dos trabalhadores”. Fazendo assim jus a sua legitimidade.

A Lei da greve traz consigo opulentos artigos sobre os sujeitos directos da greve, aqueles que estão dentro do assunto de modo efectivo ou que aderem a mesma, mas infelizmente, a greve nem sempre tem efeitos somente sobre os trabalhadores que reivindicam os seus direitos, e principalmente nesta greve que abrange uma categoria de elevada importância para a sociedade angolana que são os taxistas, acaba por ter efeitos sobre trabalhadores de outras esferas profissionais. E a par deste campo (da greve) confronta-se um outro direito que é o Direito ao Trabalho.

O trabalho é um direito económico e social consagrado no artigo 76.° da CRA, porém, da forma que aparece consagrado, trata-se de uma norma programática, precisando que o Estado crie condições para que tal direito seja exercido e que o cidadão esteja capacitado. O acto de se promover condições representa uma das tarefas fundamentais do Estado (alínea c) do artigo 21.° da CRA).

A LGT, no n.°1 do artigo 143.° consagra que as faltas podem ser justificadas ou injustificadas, sendo que para o primeiro caso, à luz do n.°2, são as que têm a autorização do empregador e os seus motivos vêem tipificados no artigo 145.° do mesmo diploma. No seu n.°3, traz a questão de que o empregador pode autorizar a falta do trabalhador por motivos que não estejam tipificados no n.°1 do mesmo artigo, mas dá a discricionariedade ao empregador de considerar ou não atendível a situação, ou seja, é o empregador quem decide se a situação é motivo suficiente para se constituir falta justificável.

O artigo 144.° aborda sobre a solicitação de faltas, no seu n.°1 consagra a regra que “o trabalhador deve solicitar ao empregador com a antecedência mínima de uma semana, a necessidade de se ausentar do serviço e respectivo motivo…”. O n.°3 traz uma excepção à regra que diz respeito as situações imprevisíveis, sendo que para estas orienta “a solicitação logo que possível, mas sempre antes de retornar ao trabalho.”.

A nível da LGT, como tal, não existe nenhuma norma expressa que aborde sobre a justificação de faltas que podemos ligar às dificuldades de transportes, como foi o caso do primeiro dia de greve dos taxistas, mas existem os motivos de justificação não tipificados, porém, a validação destes estão sujeitos a análise do empregador.

Notas conclusivas

O serviço de táxi é extremamente importante, e tem dupla finalidade, por um lado, visa fins privados por conta do investimento feito pelos particulares no âmbito do direito à propriedade privada, beneficiando os investidores, e, por outro lado, visa auxiliar o Estado tendo em vista a facilitação da mobilidade de pessoas e bens.

Neste ínterim existem os taxistas, que permitem com que este serviço aconteça. Mas por não efectivação de alguns direitos que os mesmos clamam cuja concretização depende exclusivamente do Estado, estes decidiram entrar em greve. Em função da actividade que exercem, o exercício do seu direito à greve limitou o ius ambulandi ou direito de mobilidade (n.°1 do artigo 46.° da CRA) e consequentemente impossibilitou as pessoas de chegarem ao local de trabalho.

Percebendo a impossibilidade de chegar ao local de trabalho por inexistência de meios de transportes ligado a razões alheias à sua vontade, partindo do princípio que se trata de motivos não tipificados na Lei Geral do Trabalho e tratando-se de causas imprevisíveis, de modos a justificar a sua ausência no trabalho, poderia, o trabalhador, entrar em contacto, por via telefónica, por exemplo, com a entidade empregadora de forma imediata, porém, tal acto não é garantia de justificação, pois, a autorização de faltas cujos motivos não se encontram tipificados na lei, são deixados ao critério do empregador.

Clama-se por parte da entidade empregadora o bom senso, de modo a olhar, com base na equidade, os casos dos trabalhadores afectados indirectamente por tal greve, sendo que esta diz respeito a uma categoria que facilita, grandemente, a mobilidade da maioria dos luandenses.

Pois, a LGT não traz de modo expresso que a ausência no local de trabalho por impossibilidade de deslocação constitui causa justificável para a não aplicação de falta, porém, não obstrui, de todo, essa possibilidade. Sendo que seria necessária uma maleabilidade em torno quer da própria lei, bem como do bom senso do empregador para que tal possibilidade seja possível.

Ismael Ebo

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