O diploma, de iniciativa legislativa do Executivo, foi aprovado com 105 votos a favor, 69 contra e duas abstenções, durante 7.ª Reunião Plenária Extraordinária da 1.ª Sessão Legislativa da V Legislatura da Assembleia Nacional.
O documento, apresentado no hemiciclo pelo ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Marcy Lopes, ressalta que o acompanhamento do exercício de actividade das ONG após o registo será assegurado por uma Entidade da Administração do Estado a determinar pelo Presidente da República enquanto Titular do Poder Executivo.
Competirá a essa entidade da administração do Estado acompanhar e supervisionar as actividades das ONG, de acordo com os seus programas de actividades, e garantir, entre outros, que as mesmas não possam ser usadas por organizações terroristas que se passem por entidades legítimas.
Tendo em conta as iniciativas locais das comunidades beneficiárias e a política social e económica definida pelo Executivo, as acções das ONG poderão incidir, entre outros, na assistência humanitária e social, saúde, educação, nutrição e segurança alimentar e ambiental, protecção e promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da democracia e outros valores universais.
Na mesma discussão, o grupo parlamentar da UNITA remeteu um requerimento ao Plenário, entretanto “chumbado”, para que a Proposta em apreço fosse retirada no período da ordem do dia, “por não estar conformada com os princípios constitucionais”.
A propósito, o líder do grupo parlamentar do MPLA, Virgílio de Fontes Pereira, disse que organizações não-governamentais são de grande utilidade para o desenvolvimento das populações e das comunidades, bem como para aprofundamento da democracia e o fortalecimento da cidadania.
Dada a sua utilidade, sustentou, não se pode descurar a necessidade incontornável dessas agremiações pautarem a sua organização interna e as suas actividades com índices de transparência notados e nos marcos da lei.
“Os deputados do MPLA estarão empenhados na discussão na especialidade em esmiuçar e expurgar as eventuais inconformidades, de forma a tornar o estatuto das ONG mais robusto”, vincou.
“Aprovar este estatuto seria muito grave para a vida das ONGs angolanas”
As Organizações Não-Governamentais (ONG) angolanas alegam que a proposta de lei vai prejudicar as associações que defendem os direitos humanos em Angola. “O governo angolano, por via do grupo parlamentar MPLA, quer aprovar um estatuto que visa regular o exercício de actividade, de direito das associações”, denuncia o Presidente da Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD), Serra Bango.
Em 2017, o Tribunal Constitucional considerou inconstitucional o decreto presidencial de 2015 que regulava as ONGs. “Na altura, o Presidente José Eduardo dos Santos quis aprovar um decreto presidencial para limitar o exercício do direito das associações, controlando, condicionando, fiscalizando e determinando as áreas de acção e o tipo de actividade as ONGs”, recorda.
Serra Bango lembra que “o Tribunal Constitucional tinha considerado inconstitucional a proposta, pelo facto de ser o Presidente a querer regular um direito fundamental que é da matéria reserva absoluta da Assembleia Nacional.”
O Grupo de Trabalho de Monitoria dos Direitos Humanos, que junta Organizações Não Governamentais da sociedade civil de Angola, apresentou esta quarta-feira, 24 de Maio, uma petição para protecção dos direitos das associações como um direito fundamental. “A aprovação deste estatuto seria muito grave para a vida e actividades da ONGs. Estaríamos a abrir um precedente para que a Assembleia ou o Presidente João Lourenço pudessem aprovar, por via do grupo parlamentar, leis limitadoras dos direitos liberais e fundamentais dos cidadãos”, lembra Serra Bango, signatário da petição.
O dirigente associativo lembra, ainda, que “Angola tem registado vários movimentos de contestação por causa da pobreza, da má distribuição de rendimentos, da falta de emprego, do combate à corrupção ou ainda da criminalidade. Perante estes acontecimentos, o Presidente vê o seu poder tremido e entende que quem está na base do processo de reivindicação são as ONGs.”
O Presidente da Associação Justiça, Paz e Democracia sublinha que em Angola se está a levantar uma ideia “segundo a qual o Presidente João Lourenço tem intenções de alterar a Constituição para concorrer a um terceiro mandato. Havendo na sociedade organizações que consigam perceber e travar este processo, ele não seria bem sucessivo. Convém-lhe, nesta altura, começar a pôr freios a todos aqueles que poderiam ser contestatários ou que lhe fariam oposição às suas ideias”, concluiu.
Fontes: Angop e rfi