ARBITRAGENS COMERCIAIS ENVOLVENDO EMPRESAS PÚBLICAS: A PROBLEMÁTICA DA EXTENSÃO DA CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA AO ESTADO ANGOLANO[1]
Afonso Vicente HENRIQUES[2]
Isaías 40: 29 – “Ele dá força ao cansado, e aumenta as forças ao que não tem nenhum vigor”
RESUMO
O presente artigo visa perquirir o problema da extensão da cláusula compromissória ao Estado angolano, isto nas arbitragens comerciais em que um dos contratantes é uma empresa pública e o outro contratante é uma entidade privada. Nessa senda, analisaremos o surgimento das empresas públicas e a relação que se estabelece entre estas e o Estado angolano. Propomo-nos perceber como o Estado e as suas empresas públicas estabelecem relações com entidades privadas, tendo em vista a resolução dos eventuais litígios por via da arbitragem, e para isso, importa analisar os vários diplomas legais que estabelecem aquilo que em arbitragem se chama “Arbitrabilidade Subjectiva”, em outros termos, perceber como o Estado e as empresas públicas se tornam aptos a participar de arbitragens comerciais. Trataremos de discorrer sobre a possibilidade da responsabilização do Estado angolano, tendo em conta uma relação jurídica firmada entre uma empresa pública e uma entidade privada, onde vigora o princípio da relatividade.
Palavras-chave: Estado angolano, Empresa Pública, Arbitragem Comercial, Imunidade de Jurisdição.
I – Introdução
- Posição do problema
O tema proposto incide sobre as arbitragens comerciais envolvendo o Estado angolano por via da sua administração indirecta, isto é, concretamente por via das Empresas Públicas. Destarte, estas empresas no âmbito da sua autonomia de vontade celebram contratos com outras entidades privadas, e convencionam inserir no contrato uma cláusula arbitral. A grande questão que se levanta é, se verificando o eventual litígio entre as partes contratantes, dando importância que um dos contratantes é uma empresa pública, poderá o outro contratante invocar a extensão da cláusula compromissória ao Estado angolano? Tendo em consideração que, este é responsável pela constituição e controlo da empresa, que por sinal prossegue um interesse colectivo, ou seja, do próprio Estado.
- Delimitação do tema
No âmbito deste estudo, vamos cingir a nossa reflexão na actuação do Estado angolano nas arbitragens comerciais por via das empresas pública, como se desenrola este processo e refletir sobre à questão da extensão da cláusula compromissória ao Estado angolano nas arbitragens comerciais internacionais.
II – Arbitragem comercial internacional
Iniciemos pelo próprio conceito de arbitragem. Nas palavras do Professor Lino Diamvutu “é um meio heterocompositivo de litígios, em que as partes desavindas cometem a terceiro a resolução do diferendo que as opõe, sendo a decisão do terceiro vinculativa para ambas”. A arbitragem nasce de uma convenção celebrada entre as partes, designada, convenção de arbitragem[3]. Sendo assim, por sua vez, arbitragem internacional tem por fim a solução dos litígios entre os Estados por juízes escolhidos pelos mesmos, sobre a base do respeito do direito[4].
Há dois principais tipos de arbitragem no âmbito internacional: a de Direito Público, que se pauta em tratados e convenções ditas supranacionais, e a de Direito Privado, que, embora dotada de um ou mais elementos alienígenas, pauta-se eminentemente na autonomia de vontade. Enquanto a primeira se destina a resolver litígios entre Estados, versando sobre questões territoriais, políticas e econômicas, a arbitragem que interessa ao Direito Privado se dá entre particulares e diz respeito ao comércio internacional. É sobre esta última é que discorrerá o presente estudo.
O caráter comercial da Arbitragem é de simples delimitação. Tem natureza comercial a arbitragem que dirime demandas advindas de transações comerciais, cujo conceito compreende qualquer relação de natureza mercantil, de origem contratual ou não. Quanto a sua internacionalização identifica-se a arbitragem internacional como aquela em que ao menos um elemento (nacionalidade das partes e dos árbitros, direito aplicável ou lugar de desenvolvimento da arbitragem) se vincule a uma ordem jurídica diversa da dos elementos restantes, muitos destes elementos são utilizados pelo ordenamento jurídico angolano para identificar quando é que a arbitragem é internacional, nos termos do art.º 40.º da Lei da Arbitragem Voluntária (Lei nº. 16/03, de 25 de Julho) – LAV. Assim, só seria nacional o procedimento cuja totalidade de seus elementos constituintes possuísse conexa apenas com o sistema jurídico angolano.
- Arbitrabilidade subjectiva
O critério de arbitrabilidade subjectiva do litígio, serve para verificar se as partes têm legitimidade material ou substantiva para se comprometerem em árbitros, no que respeita a determinada relação material controvertida. Em Angola o critério está previsto n.º 3 do art.º 1.º da LAV, indicando as situações em que o Estado e demais entes públicos, designadamente, as empresas públicas, podem recorrer à arbitragem.
Continue a ler no documento abaixo:
[1] Artigo JuLaw n.º 025/2022, publicado em , aos 23/03/2022.
[2] Conta JuLaw: http://julaw.ao/user/afonsohenriques/ . Estudante do 5º ano, do curso de direito, pela Universidade Metodista de Angola. E-mail: afonsohenriques031@gmail.com
[3] DIAMVUTU, Lino. “A convenção de Arbitragem no Direito Angolano”. Edições Almedina, S.A. 2016., p.17.
[4] Convenção para Solução Pacifica dos Conflitos Internacionais, artigo 15.º