Você está visualizando atualmente AMBIENTE: TAREFA DO ESTADO OU DIREITO FUNDAMENTAL DOS CIDADÃOS?
universe empresarial

AMBIENTE: TAREFA DO ESTADO OU DIREITO FUNDAMENTAL DOS CIDADÃOS?

AMBIENTE: TAREFA DO ESTADO OU DIREITO FUNDAMENTAL DOS CIDADÃOS?

Mário Tomás VERÍSSIMO[1]

RESUMO

Neste artigo, o ambiente foi tratado de modo claro e sucinto, a fim de levar à compreensão dos juristas e doutros legentes que pretendam transformar-se em polímatas, para que estes percebam que as designações que se lhe são atribuídas, apesar das diferenças, possuem características similares quando apresentadas as suas definições, constituindo, assim, conditio sine qua non[2] enquadrar-se num dos sentidos estrito ou amplo, sugerindo-se a opção pelo último, por ser aquele que mais se aproxima à perfeição desejada, amalgamando, desta feita, no seu estudo e tratamento, todos os elementos existentes neste universo.

Em suma, o conteúdo do artigo gira em torno de saber se, quanto à positivação, o ambiente é um fim do Estado, um direito fundamental dos cidadãos ou se se configura noutra modalidade que se não encaixe nas duas primeiras. Foi com base nesta intenção que se percebeu que estamos a prosseguir rumo à autonomia almejada do Direito Ambiental angolano, sem desprimor dos buracos que, ainda, precisamos tapar e dos rasgos que devemos cozer, porque se alcançou um resultado inesperado e inovador, que está estampado neste conteúdo.

Palavras e expressões-chave: Ambiente, tarefa, direito fundamental, sentido estrito/amplo.

ABSTRACT

In this article, the environment has been treated in a clear and succinct manner, in order to lead to the understanding of jurists and other ledes who wish to become polywoods, so that they realize that the designations assigned to it, despite the differences, have similar characteristics when presented their definitions, thus constituting conditio sine qua non to fit into one of the strict or broad senses, suggesting the choice for the latter, because it is the one that best approximates the desired perfection, amalgamating, this time, in its study and treatment, all the elements existing in this universe.

In a view, the content of the article revolves around whether, as far as positiveization is a state’s end, a fundamental right of citizens or whether it is configured in another modality that does not fit the first two. It was on the basis of this intention that it was realized that we are moving towards the desired autonomy of Angolan Environmental Law, without departing from the holes that, still, we need to cover and the tears that we must bake, because an unexpected and innovative result has been achieved, which is stamped in this content.

Key words and expressions: Environment, task, fundamental right, strict/broad sense.

Siglas e abreviaturas: (CRA) Constituição da República de Angola; (LBA) Lei n.º 5/98, de 19 de Junho – Lei de Bases do Ambiente; (Ss) seguintes; (CEDOUA) Curso de Especialização em Direito do Ordenamento, Urbanismo e Ambiente.

Sumários desenvolvidos: 1 – Terminologia 2 – Conceitos de ambiente e 3 – Modelos de positivação do ambiente; Conclusão; Referências bibliográficas.

Introdução

O conteúdo que se disponibiliza pretende responder a questão colocada no título, objecto do presente artigo, tendo sido dada, assim, a possibilidade de apresentar as soluções jurídico-ambientais relacionadas à temática, encabeçadas na ordem jurídica angolana.

Ambiente, o que é? Que terminologia se deve utilizar, afinal? Como está positivado? Que importância tem considerá-lo de um ou de outro jeito? O que podemos aprender com ele? É uma tarefa do Estado, um direito fundamental dos cidadãos ou existe outra forma de o considerar? Podemos nos livrar dele? Estas e outras questões foram respondidas neste artigo.

Para alcançar aquele desiderato, o autor calcorreou por meandros permitidos pelo método descritivo, após revisão bibliográfica de grafados nacionais e estrangeiros, doutrinais e legais, especializados na matéria e não só, tendo acorrido, muitas vezes, à plataforma digital disponível para os internautas.

Na tentativa de fugir dos ensinamentos de Maquiavel[3][4] de que “os fins justificam os meios”[5], o autor prematuramente percebeu que tinha de caminhar na contramão das orientações do exímio filósofo, tendo, deste jeito, alcançado melhor resultado, dado que colocou em pratos limpos a picuinha confusão que se tem feito sobre a nomenclatura originadora do título deste artigo.

Determinada a designação, para melhor percepção dos leitores que hão-de aplicar “o localizador de João Melo”[6], o autor disponibilizou uma panóplia de definições doutrinais e legais de ambiente, de escritores renomados no mercado do Direito do Ambiente, tendo tido, também, a ousadia de apresentar a sua própria visão, demonstrando, desta maneira, o grande interesse que tem destas matérias[7], deixando, assim, o artigo mais cristalino, pois se depreende do mesmo, ainda que, efectuando uma leitura dinâmica, que o termo ambiente, dependendo do ponto de vista, pode ser estrito ou amplo, tendo a Lei[8] que a rege optado por este último, tirando a possibilidade de deixar de parte qualquer elemento, que se arrogue natural ou artificial, orgânico ou inorgânico e outro, se houver.

O Morro do Moco, o Kilamanjaro e o Evereste do artigo foram atingidos quando o autor apresentou a visão jurídica da questão objecto do estudo, à nível nacional e internacional, tendo dado algumas notas exemplificativas sobre o tratamento do mesmo tema nas ordens jurídicas alemã, portuguesa, estadunidense e francesa, seguidas das notas gerais e peculiares do ordenamento angolano.

Após o sucinto e exaustivo circuito académico, o autor dignou-se apresentar um desfecho aberto, tendo este, por conta do apetitus e inesgotabilidade do tema, ousado em adaptar à realidade uma das célebres frases de Benjamin Franklin, pois, afinal, faz todo o sentido alterá-la e ajustá-la ao novo contexto.

O autor desaconselha os leitores que queiram actuar como o “homem (moçambicano) que só fazia as coisas ao meio”[9], devendo, deste modo, começar o artigo, lê-lo na íntegra, podendo, assim, explorá-lo melhor[10].

1 – Terminologia

Tem-se debatido muito sobre a questão de saber a nomenclatura correcta que devemos adoptar: meio ambiente, ambiente, meio ou um outro. Vale adiantar que não precisamos gastar tintas das nossas preciosas esferográficas, muito menos desembolsar a lubrificação das nossas laringe e faringe para batermos e rebatermos acerca desta temática, porquanto é uma situação cuja solução já paira entre nós como o oxigénio que utilizamos recorrentemente.

Saliente-se, então, que o termo meio ambiente é redudante, pois a palavra meio significa ambiente. Mas esta é daquelas redundâncias que tem, até certo ponto, uma certa razão de ser, por imposições históricas e dificuldades em traduzir termos de uma língua à  outra, visto que durante a Convenção das Nações Unidas Sobre o Meio Humano, Conferência de Estocolmo, de 1972, a imprecisão terminológica das traduções do inglês para o espanhol e para o português fez com que se plasmasse o termo “meio ambiente”, como de uso comum, em vez de se utilizar apenas um dos termos, ou meio, ou ambiente, que é lógico.

Ante à vexata quaestio[11], o ordenamento jurídico angolano manteve-se impávido e sereno, ganhando como troco benéfico a adopção de todas as terminologias possíveis que incidam sobre o ambiente. Parece estar mais preocupado com a protecção em si e não com a designação.

Nesta senda, vale apresentar aqui alguns exemplos:

  1. A alínea m) do artigo 21.º, os n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 39.º, a alínea h) do n.º 1 do artigo 89.º, o n.º 2 do artigo 91.º todos da CRA, designam-no por ambiente.
  2. O artigo 74.º da CRA cognomina-o por meio ambiente.
  3. A alínea q) do n.º 1 do artigo 165.º da CRA considera-o equilíbrio ambiental.

2 – Conceitos de Ambiente

Desde os tempos mais remotos, muitos são os autores que, inconformadamente, apresentaram definições de ambiente, muitas vezes, trazendo à tona novos conceitos e, outras, refutando ideias anteriores, mas sempre com o escopo de melhor ilustrar a realidade que nos circunda. Foi com esta fome que estes o fizeram, de modo igual e diferente, preferindo uma visão estrita ou ampla, conforme lhes aprouverem.

Desta feita, o ambiente, na perspectiva de Araújo et al[12], citados pelos professores Simba[13] e Kinanga[14], representa “os bens naturais, artificiais e culturais de valor juridicamente protegidos”[15]. Para estes autores, o referido conceito é amplo, uma vez que pode incluir não só os elementos naturais como a água, o ar, o solo, o subsolo, a fauna e a flora, mas também os elementos ambientais construídos ou artificiais como o património artístico, cultural, histórico, paisagístico, monumental e arqueológico. Para eles, este conceito confunde o ambiente e a natureza porque aquele é mais amplo do que este, podendo o ambiente abarcar a totalidade de vida do homem, incluindo-se os factores criados ou construídos pelo próprio homem e não apenas os elementos naturais que o homem encontra na terra.

Para Canotilho, citado pelos professores Simba e Kinanga, que adopta um conceito estrito de ambiente, incluindo apenas os seus elementos naturais, que “são o resultado de processos ecológicos naturais, produtos ou dádivas da natureza cuja criação não há, em princípio, intervenção humana”[16]. Para Wellington Pacheco Barros, citado por Cavanda e Ambrósio, o ambiente é “tudo aquilo que cerca ou envolve os seres vivos ou coisas”[17].

Continue a ler no documento abaixo:


[1] Jurista, advogado (estagiário) e docente universitário na Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto (FDUAN). Pós-Graduado em Direito do Mar, na Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto, em cooperação com a Delegação da União Europeia em Angola.

Autor dos artigos:

 1.º O concurso de crimes: uma contraposição do Código Penal de 1886 e o novo Código Penal angolano;

 2.º A tutela jurídico-ambiental dos aterros sanitários em Angola “Estudo de caso Aterro Sanitário dos Mulenvos”;

3.º Os subsídios da economia azul no desenvolvimento do mar angolano: a sustentabilidade aplicada à pesca; e

4.º Duplos três anos de vitória mundial (crónica).

[2] Cfr. Expressão latina que, em português, significa condição sem a qual.

[3] Nicolau Maquiavel (1469-1527) foi um filósofo político, historiador e escritor italiano, autor da obra-prima “O Príncipe”. Foi profundo conhecedor da política da época, estudou-a em suas diferentes obras. Viveu durante o governo de Lourenço de Médici. Realista e patriota definiu os meios para a unificação da Itália. Nicolau Maquiavel nasceu em Florença, Itália, no dia 3 de maio de 1469. Sua família de origem Toscana participou dos cargos públicos por mais de três séculos. Seu pai, Bernardo Maquiavel, era jurista e tesoureiro da província de Marca de Ancona. Sua mãe, Bartolomea Nelli, era ligada às mais ilustres família de Florença. Interessado pelos problemas de seu tempo, Maquiavel participou activamente da política de Florença. Com 29 anos, tornou-se secretário da Segunda Chancelaria durante o governo de Piero Soderini. Tinha a seu cargo questões militares e de ordem interna. Realizou várias missões diplomáticas envolvendo a França, Alemanha, os Estados papais e diversas cidades italianas, como Milão, Pisa e Veneza. Entre 1502 e 1503, Maquiavel exerceu o cargo de embaixador junto a César Bórgia, filho do papa Alexandre VI e capitão das forças papais, que dominava o governo papal. Vide Biografia de Nicolau Maquiavel – eBiografia consultado pela última vez no dia 14 de Dezembro de 2021, às 11:35.

[4] Cfr. WARBUTON, Nigel – Uma Pequena História da Filosofia, Edições 70, Maio de 2012, página 65. Nicolau Maquiavel, viveu entre 1469 e 1527, é autor dos livros O Príncipe e a Mandrágora.

Vide                 google,com/search?gs_ssp=eJzj4tDP1TcwTS4rNmD0EszLTM7PSSxV, consultado pela última vez no dia 12 de Dezembro de 2021, às 19:46.

[5] Cfr. idem. Página 67.

Vide google.com/search?q=os+fins+justificam+os+meios&oq=os+fins+justificam+os+meios consultado pela última vez no dia 12 de Dezembro de 2021,às 19:18.

[6] Cfr. O localizador é um conto de João Melo. Vide páginas 75 e seguintes do livro O Homem que não Tirava o Palito da Boca.

[7] Faz sentido elencar a famosa frase: “the more you study, the more you learn”, podendo, alterá-la para: “the more you study about something, the more you learn about that thing” (adaptação do autor).

[8] Cfr. Entenda-se Lei n.º 5/98, de 19 de Junho – Lei de Bases do Ambiente.

[9] O conto aflorado é, à semelhança de As regras de Ntemangau e outros, um escrito do moçambicano Daniel Costa, que se encontra no livro A ciência de Deus e o sexo das borboletas.

[10] O autor disponibiliza o seu correio electrónico para maior interacção com os leitores: mariotomasverissimo1992@gmail.com e mtverissimo@outlook.pt

[11] Cfr. Expressão latina que, em português, significa questão ou assunto bastante controverso.

[12] Cfr. Abreviação de uma expressão em latim que, em português, quer dizer “e outros”.

[13] Eduardo Mendes Simba, é docente na Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto e formador  do Instituto de Formação da Administração Local (IFAL), leccionando as disciplinas de Direito dos Recursos Naturais, Direito do Ambiente, Direito Administrativo e Administração Local do Estado. Cfr. SIMBA, Eduardo Mendes e SANTOS, Pedro Kinanga dos – Direito do Ambiente Angolano – I volume, Ubi Uris, Luanda, 2018, última do livro (capa).

[14] Cfr. Pedro Kinanga dos Santos, é docente na Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto e do Instituto Superior de Gestão, Logística e Transporte (ISGEST), lecciona as didciplinas de Direito Administrativo, Direito do Urbanismo e do Ordenamento do Território e Direito do Ambiente. Cfr. Idem.

[15] Cfr. Idem. página 15.

[16] Cfr. Idem. Página 16

[17] Cfr. CAVANDA, David Manuel e AMBRÓSIO, Hermenegildo da Costa – TUTELA AMBIENTAL Análise Jurídico-protectiva e Sustentável – Mayamba, 1.ª edição, Luanda, Setembro de 2020, página 26.

Deixe um comentário