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A Família e os alimentos

A FAMÍLIA E OS ALIMENTOS.

ALIMENTOS PROVISÓRIOS E EXECUÇÃO ESPECIAL DE ALIMENTOS.[1]

Élgano Pedro Alexandre RIBEIRO[2]

“De forma geral, os homens são bons e maus ao mesmo tempo, tudo depende do lado que mais for valorizado e estimulado.

Marcolino Moco

RESUMO

O presente artigo visa analisar os alimentos no seio de uma determinada família, qual o papel dos membros da família no âmbito da prestação de alimentos. De referir que este Direito, está salvaguardado na Constituição de Angola, porque a prestação de alimentos tem como finalidade garantir que todo indivíduo tenha uma vida digna. Neste artigo abordaremos o objecto do instituto da prestação de alimentos e, em que circunstância surge, quem presta e quem se beneficia. É por demais evidente que os alimentos compreendem tudo o que for necessário ao sustento, saúde, habitação e vestuário. Nesta ordem de ideia, quem pode requerer alimentos são os menores e as pessoas que não possam pelo trabalho garantir o seu sustento e não disponham de recursos. Adoptamos o método analítico servindo-se da técnica de pesquisa bibliográfica, como procedimento metodológico.

Palavras-chave: Família, alimentos, Prestação de alimentos, direitos e deveres, cônjuge, menor, divórcio.

ABSTRACT

This article aims to analyze the alimony within a given family, what is the role of family members in the provision of alimony. It should be noted that this right is safeguarded in the Constitution of Angola, because the provision of food is intended to ensure that every individual has a decent life.

In this article we will address the institute´s object of providing maintenance and, under what circumstances, who provides and who benefits. I tis all too evident that food comprises everything necessary for sustenance, health, shelter and clothing. In this order of idea, those who can request food are minors and people who cannot, through work, guarantee their livelihood and do not have resources. We adopted the analytical method using the bibliographic research technique as a methodological procedure.

Keywords: Family, foods, Provision of maintenance, rights and duties, spouse, minor, divorce.

Introdução

Não estaríamos a falar de prestação de alimentos se não houvesse família, é nesta dependência que, podemos definir a família como a célula básica da sociedade. A família humana funda-se no casamento e, na sua forma mais simples, é formada por marido e mulher, com ou sem prole.

No casamento, marido e mulher dão-se mutuamente em amor, criando um ambiente em que os filhos podem nascer e desenvolver-se, tomar consciência da sua dignidade e preparar-se para o destino que os espera e que é único e individual.

Ora, deve haver cooperação económica no seio familiar, os seres humanos são um recurso humano vital. Sem pessoas não há desenvolvimento económico. A família proporciona este recurso vital através da reprodução. Além disso, os membros da família trabalham em conjunto para providenciarem as suas necessidades básicas e gerarem proveitos em comum.

Assim como há união entre um homem e uma mulher por meio do casamento ou da união de facto, muita das vezes, esses relacionamentos por vários motivos, alheios a vontade das partes acabam por dissolver-se, pela morte de um dos cônjuges, pela declaração judicial da presunção de morte ou pelo divórcio.

É nestas adversidades e não só, que surge a necessidade da prestação de alimentos para quem deles careça, os alimentos compreendem tudo o que for necessário ao sustento, saúde, habitação e vestuário e, no caso dos menores os alimentos compreendem ainda a educação e instrução.

Quando não há entendimento entre o casal quanto as suas responsabilidades, findo o casamento ou união de facto, essa situação fica salvaguardada pelo Direito de Família enquanto ciência normativa.

Ora, Direito de Família é o ramo do Direito Civil que trata das relações familiares e das obrigações e direitos decorrentes dessas relações, tem como conteúdo os estudos da afinidade, casamento, união de facto, parentesco, relações entre pais e filhos, filiação, adopção, tutela, alimentos.

No presente artigo falaremos da responsabilidade dos membros da família em prestar alimentos a quem deles careça. A paternidade responsável também tem um aspecto financeiro, é importante viver com um certo nível de dignidade humana, os filhos não devem sofrer pela separação dos pais.

É por isso que a família, como núcleo fundamental da organização da sociedade, é objecto de proteção do Estado, quer se fundamente em casamento, quer em união de facto[3].

  1. Definição de Família

Segundo os autores Jane M. Kiura, Regina Gitau e Andrew (2014, p. 7), a família é, pois, o santuário da vida humana. Foi desejo de Deus, que, de acordo com a Bíblia, criou o primeiro homem e a primeira mulher, que eles se tornassem marido e mulher e ordenou-lhes que dessem início à família humana. A família é, pois, sagrada e é o lugar em que a vida humana (um precioso dom de Deus) pode ser convenientemente recebida, protegida e sustentada.

A família também se define como um sistema (Bradshaw, 1995). Tecnicamente, um sistema é formado por «conjuntos de elementos interagindo». O sistema familiar é formado por pessoas unidas por relações. Cada indivíduo é uma pessoa completa e ao mesmo tempo parte integrante da família. O sistema familiar revela-se, então, uma comunidade de pessoas que interagem e se relacionam como resultado de uma ligação matrimonial, de sangue ou por adopção.

Já a Constituição da República de Angola[4] define a família como o núcleo fundamental da organização da sociedade e é objecto de especial protecção do Estado, quer se funde em casamento, quer em união de facto, entre homem e mulher. Ora, nos termos da Constituição e da lei todos têm o direito de livremente constituir família.

Entretanto, um dos princípios fundamentais incorporado no Código da Família[5], faz referência a harmonia e responsabilidade no seio da família. O corpo do seu texto diz que “ a família deve contribuir para a educação de todos os seus membros no espírito do amor ao trabalho, do respeito pelos valores culturais e do combate às concepções ultrapassadas no seio do povo…deve contribuir para o desenvolvimento harmonioso e equilibrado de todos os seus membros, para que cada um possa realizar plenamente a sua personalidade e as suas aptidões, no interesse de toda sociedade”.

Para concluir esse ponto, os autores Jane M. Kiura, Regina Gitau e Andrew (2014, p. 8), fazem a distinção da família em dois tipos: a família nuclear e a família alargada. A família nuclear compõe-se de marido, mulher e filhos, é a família na sua forma mais simples. Já a segunda é formada pela família nuclear e pelos outros parentes.

Devido a globalização, nos dias de hoje, a família sofreu muitas modificações e, entre os dois tipos de família atrás descritos, há muitas situações familiares que surgiram devido à realidade sócio-económica. A destruturação das famílias, no caso particular de Angola, deve-se as condições de pobreza extrema, de certa forma, essa triste realidade afecta em muitos casos os lares, separação de facto, divórcios e rupturas, interferem na prestação de alimentos.

  • O Papel dos Membros da Família no Âmbito da Prestação de Alimentos

O papel de cada membro da família é contribuir para o funcionamento da família como unidade. Cada um deve esforçar-se para estabelecer um relacionamento saudável com os outros membros da família, uma vez que a família é a mais importante forma de agrupamento humano. É na família que as pessoas desenvolvem a sua identidade e sentido de pertença.

Dentro deste contexto, mencionam Jane M. Kiura, Regina Gitau e Andrew (2014, p. 132): A paternidade humana é muito mais que gerar uma prole. A procriação implica assumir a responsabilidade pelo destino das crianças, e a paternidade responsável tem a ver com o desempenho deste dever com muita fidelidade. Significa também educar os filhos, prepará-los para a vida e guiar os seus passos em direcção à salvação eterna. A Constituição Pastoral «A igreja no Mundo Contemporâneo» (Gaudium et Spes) resume de forma clara esta responsabilidade nas seguintes palavras:

«Por sua natureza, a própria instituição matrimonial e o amor conjugal estão ordenados para a procriação e educação da prole, que constituem a sua coroa» (GS 48).

O que veio a este mundo, através do amor, deve ser cuidado com muito amor. Ambos, pai e mãe, devem assumir a responsabilidade completa pela educação e sustento dos filhos. Da mesma maneira que foram responsáveis pela concepção dos filhos, os pais têm de ser responsáveis pelo seu presente e futuro.  

Os progenitores são igualmente responsáveis pela tarefa da formação dos filhos. Nenhum deles se deve furtar a esta obrigação moral. Em particular, o pai deve resistir à tentação de pensar que as suas absorventes obrigações profissionais justificam deixar esta tarefa para a mãe. Tal atitude não só peca pelo excessivo amor pelo seu próprio conforto como pedagogicamente se revela ineficaz.

A prestação de alimentos tem como finalidade garantir que todo indivíduo tenha uma vida digna, pois é tida como um direito fundamental, previsto na Constituição de Angola “O Estado respeita e protege a pessoa e a dignidade humana”, imagina um menor, tendo os pais separados, um dos cônjuges não presta alimentos e, o que o outro dá não é suficiente, esse menor terá problemas, pois, as suas necessidades básicas não serão satisfeitas.

É bom lembrar que o Estado[6] também tem a responsabilidade e o dever de acautelar essa situação, se os membros da família não tiverem condições para proporcionar alimentos aos seus parentes, o Estado tem esse dever, por ser ele um ente público responsável pela sociedade e pelos seus indivíduos.

Nesse sentido, prevê Sílvio Rodrigues[7] (RODRIGUES, 2008, p.373) a tendência moderna é a de impor ao Estado o dever de socorro dos necessitados, tarefa que ele se desincumbe, ou deve desincumbir-se, por meio de sua actividade assistencial. Mas, no intuito de aliviar-se desse encargo, ou na inviabilidade de cumpri-lo, o Estado o transfere, por determinação legal, aos parentes, cônjuges ou companheiro do necessitado, cada vez que aqueles possam atender a tal incumbência.

Para salvaguardar a estabilidade da família, os diferentes membros precisam de saber quais os papéis que lhes estão atribuídos e como os devem desempenhar efectivamente.

Na maioria das vezes, os vínculos afectivos ou não estabelecidos pela família entre seus membros são suficientes para a garantia do cumprimento dessas funções. Pais se sacrificam para dar estudos aos filhos, irmão ajuda a irmã desempregada, filhos unidos ajudam os seus pais na velhice, criando todas as condições necessárias e dignas. Essas acções acontecem, em geral, porque os familiares são unidos e se consideram responsáveis uns pelos outros.

A família precisa de um pai e de uma mãe que sejam dedicados um ao outro e determinados a fazer tudo o que estiver ao seu alcance para que os seus filhos sigam o caminho correcto. Deste modo, os pais têm o dever de alimentar os seus filhos, dispensar-lhes tempo, atenção e orientá-los.

Quando, porém, os laços familiares não são suficientes para assegurar o apoio que alguém precisa da família, a lei o obriga por meio do instituto dos alimentos. O dever de prestar alimentos funda-se na solidariedade humana e económica que deve existir entre os membros da família ou os parentes. Há “um dever legal de mútuo auxílio familiar, transformado em norma, ou mandamento jurídico” Carlos Roberto Gonçalves[8] (GONÇALVES, 2017, p. 653).

Leia o artigo completo no documento abaixo:


[1] Artigo científico para Julaw- Revista Jurídica Digital (www.julaw.co.ao)

[2] Advogado.

[3] Artigo 1.º do Código da Família.

[4] Vide o artigo 35.º da Constituição de Angola, 2010.

[5] Vide a Lei n.º 1/88, de 20 de Fevereiro- Código da Família no título I, artigo 2.º

[6] O termo Estado (do latim status: modo de estar, situação, condição) data do século XIII e se refere a qualquer país soberano, com estrutura própria e politicamente organizado, bem como designa o conjunto das instituições que controlam e administram uma nação. Estado não se confunde com governo. O Estado é estruturado política, social e juridicamente, ocupando um território definido onde, normalmente, a lei máxima é uma constituição escrita- de onde também surge a legitimação de sua actuação e existência. É dirigido por um governo que possui soberania determinada tanto interna como externamente. Um Estado soberano é sintetizado pela máxima “Um governo, um povo, um território”.

[7] Sílvio Rodrigues (Tatuí, 1 de março de 1917 – São Paulo, 18 de janeiro de 2004) foi um advogado e Professor Catedrático de Direito Civil na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo. Deixou obra significativa para o ensino jurídico no Brasil, em especial, a coleção de sete volumes intitulada Direito Civil, publicada inicialmente pela Editora Max Limonad, e posteriormente pela Editora Saraiva. Em 1960 tornou-se Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

[8] Carlos Roberto Gonçalves (1938) é um professor, árbitro, escritor e desembargador aposentado brasileiro, que se dedica ao estudo do direito civil. Foi desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) e realizou mestrado em direito civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Entre outras, sua obra Direito Civil Brasileiro, em 7 volumes, é frequentemente citada no Brasil em decisões de tribunais superiores como o Superior Tribunal de Justiça (STJ). É membro fundador da Academia Brasileira de Direito Civil.

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