A PROBLEMÁTICA dos direitos autorais no “kuduro”- o não pagamento por parte das rádios ”
EMERSON TAVARES CONGO[1]
“Além da componente dança, música e cultural há a necessidade de analisar o “Kuduro” numa componente negocial e respectivamente jurídica, merecedora de respaldo legal. A arte morre se não se valorizar o autor.”
Emerson Congo
RESUMO
O presente estudo incide sobre os direitos autorais no género musical “kuduro”, propriamente a inadimplência por parte das rádios. De início muito contestada, o kuduro foi alvo de várias críticas. Actualmente, com um paradigma diferente é bem aceite no seio da população. As emissoras de rádios diariamente tocam vários tipos de kuduro, alegrando os ouvintes e garantindo um número elevando de audiência. Contudo o inadimplemento por parte das rádios no que toca os direitos autorais constitui um grande problema, tanto para o kuduro como para os seus autores que reclamam por uma remuneração justa fruto da sua capacidade criativa/ intelectual. As execuções de obras musicais nas rádios devem estar sujeitas a uma cobrança, de modo a garantir o respeito, dignidade e motivação do autor.
Palavras-chaves: kuduro, direitos autorais, autor, rádios, cobrança.
ABSTRACT
The present study focuses on copyright in the musical genre “Kuduro”, properly the inadequacy on the part of radio stations. At first very contested, Kuduro was the target of several criticisms. Currently with a different paradigm, it is well accepted within the population. The radio stations daily play various kuduros, cheering the listeners and guaranteeing an increasing number of audiences. However, the lack of compliance on the part of radio stations with regard to copyright is a big problem, both for Kuduro and for its authors who claim for fair remuneration because of their creative/intellectual capacity. The performances of musical works on radios must be subject to a charge, in order to guarantee the respect, dignity and motivation of the author.
Keywords: kuduro, copyright, author, radios, collection.
Sumário: Introdução; 1 – Kuduro enquanto estilo musical; 1.1. Kuduro (música); 1.2. Perspectiva histórica do kuduro; 2 – Kuduro e os meios de comunicação; 2.1. Meios de Comunicação; 2.2. Rádio; 3 – Kuduro e os direitos autorais; 3.1. Kuduro enquanto propriedade intelectual; 3.2. Direitos autorais no kuduro; 3.3. Pagamento pelas emissoras de radiodifusão; Conclusão; Bibliografia.
Introdução
Fruto da capacidade criativa de um povo que na altura viva um clima de guerra, surgiu um género musical, o Kuduro. Produto inquestionável dos subúrbios de Luanda exprimiu desde muito cedo a vivência da população. Caracterizada por um ritmo de batidas fortes e aceleradas com passos de dança extravagantes, o Kuduro é uma “obra”, protegida pelos direitos autorais.
As rádios desempenharam um papel forte na projecção do Kuduro e hoje a execução dessas músicas é causa para aderência de mais ouvintes nas emissoras de radiodifusão. Autores de Kuduro se sentem orgulhosos e dignificados quando suas obras são executadas nas rádios, há uma garantia de popularização da própria música. Seguramente cria-se a “falsa ideia” que tal acto é uma espécie de favor que as emissoras de radiodifusão fazem aos artistas.
O direito concede protecção aos autores, enquanto criadores de obras no domínio da música, artes, ciência, etc, tal tutela blinda-os dos eventuais problemas que ao longo da sua actividade actividade criativa/intelectual possam surgir. O mercado musical é extremamente agressivo, a cada dia surge um novo artista, com uma nova música, uma nova obra que também necessita protecção.
A utilização das obras dos autores em regra deve ser feita mediante a autorização do mesmo e a cobrança de um determinado valor. As emissoras de radiodifusão como usuários de obras dos autores, nomeadamente na vertente musical abstêm-se ao pagamento de direito autorais aos autores. Tal inadimplemento causa certos condicionalismos, para os autores.
Na análise deste tema nos focaremos nos direitos autorais, no âmbito do Kuduro. A relação deste género musical com a propriedade intelectual; a dignidade constitucional da mesma; bem como laivos da sua evolução histórica. Abordando ainda, a questão do inadimplemento por parte das rádios no que tange os direitos autorais.
- Kuduro Enquanto Género Musical
- Kuduro (música)
A “música”[2], desde os primórdios da humanidade, sempre teve associada com a antropologia do próprio Homem, sendo uma manifestação da criatividade humana, expressando valores sociais, políticos, educacionais e culturais, sempre como fruto da capacidade intelectual dos indivíduos.
Embrionário nos subúrbios de Luanda (Angola) na década de 90, o “kuduro”[3] é um género musical, tipicamente angolano que se alastrou nos demais cantos do mundo. Influenciado pelos ritmos africanos e as misturas típicas do “rap” com uma maior aceleração, surgiu um estilo que exprimia o folclore luandense. O nome do género foi dado por influência de um passo de dança que consistia no movimentar do quadril, passando a ideia que as nádegas ficavam contraídas.
- Perspectiva histórica do kuduro
Os longos anos de guerra causaram perdas económicas tremendas para a população angolana. Nesta luta titânica com os efeitos nevrálgicos da guerra, várias comunidades nas diferentes províncias do país, viram a ida para a capital, a solução mais viável para escapar o “monstro” da guerra e os seus efeitos. Esse êxodo rural massificado e desesperado teve como consequência inevitável uma explosão demográfica da cidade de Luanda. Uma cidade prevista para cerca de 500 mil habitantes, na década de 90 tinha quase 12 milhões de habitantes[4]. Chegando a cidade, essas populações, não tendo uma inicial aceitação social, cultural e principalmente política, começaram a se instalar em zonas distantes da urbe. Criaram-se então certos focos habitacionais, maioritariamente de cidadãos mais carenciados, zonas suburbanas designadas de Musseque[5]. No meio da carência dessas zonas e da crise económica que o país vivia, fruto da guerra e as constantes recessões surgiria o kuduro. “O kuduro surgiu, assim, do universo imaginário estimulado pela situação de carência e escassez que vivera Angola”[6]. O estilo veio dar resposta a uma certa ausência de produção musical nacional que existia na década de 90, não esqueçamos que muitas músicas tendo em conta a conjuntura do país na época emigraram. “A produção cultural e, em particular, a musical entrou em crise. Produtores e músicos viram-se sem formas de financiar a manutenção e a compra de equipamentos musicais. A teve o seu efeito: produziu o vazio institucional que servia antes de tutela aos cânones da música indústria fonográfica desapareceu e muitos artistas emigraram para o estrangeiro, principalmente Portugal. A ausência dos músicos profissionais mais conceituados angolana. Nos anos 90, boa parte do que se ouviu e do que se dançou em Luanda foi facilitado por um dinâmico circuito de importação musical através do qual entrou também a “música nacional” feita no estrangeiro e, em igual proporção, a “música estrangeira” que circulava sem fronteiras globais, chegando também a Angola.”[7]
Leia o artigo completo no documento abaixo:
[1] Licenciando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Católica de Angola.
[2] “É arte de combinar os sons em sucessão temporal” – Enciclopédia Diário de Notícias (Volume 2- I a Z), pág. 1223.
[3] “O nome da dança referia-se a um movimento peculiar em que os dançarinos parecem ter a bunda dura, simulando uma forma agressiva e agitada de dançar como os golpes de Van Damme” – https://pt.wikipedia.org/wiki/Kuduro.
[4] Em 1990 Angola tinha 11,8 Milhões de habitantes- Fonte Banco.
[5] Palavra adveniente da língua nacional angolana, que significa bairro suburbanos.
[6] Tomás, Cláudio & MARCON, FRANK- Kuduro, Juventude e Estilo de Vida: Estética da diferença e cenário de escassez, pág. 146.
[7] Tomás, Cláudio & Marcon, frank- ob. Cit. Pág. 144.