Nicolau Dinis Candandilo, Jurista, Uíge.
O presente artigo dispõe dos respectivos itens, a saber: Resumo; 1) Delinquência Juvenil; 2) Implicações a capacidade de discernimento a prática do crime; 3) A Reforma do Código Penal de 1886. 4) Análise sobre o transversal posicionamento legal da idade penal juvenil em Angola; 5. Visão adversa ao espírito do legislador ordinário à Luz do novo Código Penal; Conclusão; Referências Bibliográficas.
RESUMO
O presente artigo dispõe de uma reflexão adversa ao espírito do legislador ordinário angolano em torno do novo Código Penal, na vertente subjacente a idade penal juvenil; recalcando a visível realidade transversal catapultada do código de 1886 ao novo paradigma social inquestionável e particularmente diferente da evolução das relações sociais e comportamental dos indivíduos nela inserido. Situação inconcebível de sua manutenção, cuja abdicação atinente à redução da idade penal juvenil inquieta-nos, tendo em conta a dimensão criminal protagonizada nas últimas décadas por indivíduos que em razão da sua idade encontram-se exclusos da responsabilidade criminal.
ABSTRACT
The present article has an adverse reflection on the spirit of the Angolan ordinary legislator around the new Penal Code in the aspect underlying the juvenile penal age; stressing the visible transversal reality catapulted from the 1886 code to the new unquestionable and particularly different social paradigm, of the evolution of social and behavioral relations of the individuals inserted in it. An inconceivable situation of its maintenance, whose abdication related to the reduction of the juvenile penal age worries us, taking into account the criminal dimension played in the last decades by individuals who, due to their age, are excluded from criminal responsibility.
INTRODUÇÃO
Tal como hodiernamente se conhece, a sociedade constitui-se sobre um núcleo de valores cujo respeito é necessário a sua própria existência e desenvolvimento. Se numa sociedade bens como a vida, honra, liberdade, propriedade, etc., fossem frequente e impunemente violados, depressa se dissolveria. Por isso impõe-se a organização de formas particularmente eficazes de tutela dos valores essenciais da vida comunitária, sujeitando aqueles que os violam a reacções jurídicas de marcada severidade.(1)
Nas sociedades actuais, a violência e agressividade fazem parte do dia-a-dia. Todos os dias somos informados através da televisão, do rádio e dos jornais por notícias que nos relatam cenários de actos criminosos como furtos, roubos, violência extrema, crimes sexuais e crimes contra a vida em vários lugares do país e em vários países do mundo como Angola.(2)
Para alcançar tal desiderato, serve-se o Direito Penal de duas categorias jurídicas estreitamente correlacionadas: O crime e a pena.
O crime é de facto entendido como a sanção a todo o comportamento que viola regras de convivência social criminalmente protegida. Ao passo que a pena vai consistir na reacção jurídica que a lei liga à prática do crime. Entretanto, com quanto a pena seja a sanção típica do Direito criminal, sabemos que, dado o seu carácter ético-retributivo, só é aplicável a delinquentes imputáveis; para garantir a defesa da sociedade contra os inimputáveis, especialmente perigosos, no qual obrigam o Direito criminal de lançar mão das chamadas medidas de segurança.
Ora, face a compreensão destes conceitos, é de todo agrado entender o Direito Criminal como conjunto de normas que definem os crimes e as sanções, resultantes da violação de direitos e princípios constitucionais, subscritos como tal pela lei penal.
Em sede da própria natureza social, ninguém ignora que o homem é um ser cuja natureza é essencialmente social: é na célebre definição de Aristóteles, um animal político porque nasceu para viver em comunidade (polis), sendo dotado de sentimentos e de razão.(3)
A evolução jurídica é atraída aos factos sociais, uma realidade adjacente a razão de ser do Direito. Porém, perante tais factos, urge a necessidade de adaptar a conduta humana aos novos tipos legais de crimes, no intuito de reprimir as práticas que põem em causa o bem-estar social, através do notório intercâmbio das relações afectivas e de interesses que norteiam os indivíduos, no sentido em que, fruto destas relações é de facto susceptível de se observar excessos na sua actuação, que em boa parte culminam em violações de direitos difusos legalmente tutelados constitucional e infraconstitucionalmente, tal como se notar a salvaguarda do bem vida (art. 30.º da CRA) e à integridade pessoal (art. 31.º nº 1.º da CRA), com resguardo a integridade moral e física de qualquer indivíduo livremente ao serviço da sociedade.(4)
Entretanto, a salvaguarda e protecção destes direitos na linhagem infraconstitucional baseia-se aos normativos destinados ao instituto da resguarda e respeito da dignidade humana (a título de exemplo o artigo 70.º do CC) (5), que passam não só pela exigência do carácter absoluto da personalidade humana, bem como da precaução das circunstâncias que levam a limitar o exercício destes direitos. Ora, trata-se, no entanto, das situações de guerra, a ponderação de interesses em jogo, a própria natureza do bem da personalidade e em certos casos o consentimento do ofendido, etc.
Entretanto, as referidas limitações subscritas inerentes a reacções de violação de direitos legais, têm tratamento diferente em relação aos casos imprevisíveis por lei, em que a toda necessidade de se reprimir severamente o autor do acto pela sua conduta repugnante, diante dos olhos de um ser comprometido com à justiça e o bem-estar social que luta vivamente para reposição da legalidade nas variadas vertentes que assolam e medeiam os vínculos sociais, tendo em conta a própria tradução virada ao conceito de sociedade. A estas realidades o Direito não se pode calar, intervindo assim para os regular.
1. Delinquência Juvenil.
Segundo as ciências sociais, o jovem encontra-se numa situação em que ainda não é adulto, mas já deixou de ser criança. Ou seja, já não é protegido pela restante sociedade, como um ser indefeso e incapaz de racionalizar coerentemente sobre as suas escolhas de vida, mas também não é uma pessoa adulta com um conjunto de responsabilidades que normalmente lhe estão associadas, responsabilidades essas reservadas na maioria das vezes, aos pais.
Este conflito interior gerado pelo jovem originará um enfraquecimento das suas relações sociais que poderá aumentar o sentido de revolta e o poder de autonomia em relação aos pais, bem como aos restantes atores sociais, principalmente dentro da comunidade escolar, onde o jovem passa grande parte da sua adolescência e se forma enquanto pessoa. Tais comportamentos parecem ter, nesta fase, como único objectivo chamar a atenção dos pais e dos professores, que revestem os sinais de uma perturbação profunda da afectividade.
Nesta lógica de ideia, prende-se a necessidade de catapultar-se de forma breve e sintética, a noção restrita do conceito adolescência, no qual se prende na ideia de que ela é um período da vida em que os afectos depressivos são frequentes.
Neste âmbito, salienta-se de que o próprio contexto socioeconómico e familiar em que o adolescente está inserido pode ser um elemento relevante e propiciador de comportamentos violentos, o que leva à delinquência juvenil.(6)
O conceito de delinquência juvenil não é definido de forma clara e unânime pela doutrina, tendo sido oferecidas alternativas terminológicas tais como criminalidade juvenil ou criminalidade da juventude.(7) No entanto, são considerados actos indiciadores da delinquência juvenil o consumo de drogas prostituição juvenil, a mendicidade, a rebeldia familiar e a indisciplina escolar grave.
Este conceito pode ser perspectivado de modo amplo ou restrito. Em sentido amplo engloba os actos praticados durante a infância e a adolescência que constituam violações da ordem social e, por isso, punidas a título criminal ou contraordenacional, bem como outras condutas, de menor gravidade, que, não sendo punidas, não deixam de representar um desvio ao comportamento normal expectável de uma criança ou jovem.
No âmbito restrito, a delinquência juvenil refere-se apenas e tão só às condutas praticadas no decurso da infância e da adolescência que são tipificadas como crime pelo direito penal. Este fenómeno começa a manifestar-se com maior encalce na idade escolar, não é mais do que o aparecimento de um comportamento que evoluiu a partir da infância e que se manifesta inicialmente por mentiras, pequenos furtos, procura de objectos com o intuito de destruí-los, pela desordem, pela violência e por condutas destrutivas. Surge muitas vezes no âmbito de um grupo de amigos que se junta com o objectivo de praticar actos de vandalismo.(8)
A par das investigações desencadeadas sobre análise em questão, subscreve- se que na perspectiva sociológica, os desvios são identificados de acordo com dois modelos distintos, a saber: o de controlo social e o da identidade de subcultura.
O primeiro modelo assenta na ideia de que o desvio funciona como resultado da não conformidade do jovem com as estruturas de autoridade que lhe são impostas pela sociedade, dado que a idade em que ocorre a adolescência (12-17 anos) é uma idade vulnerável e propícia à prática do desvio comportamental. Refere-se apenas e tão só às condutas praticadas no decurso da infância e da adolescência que são tipificadas como crime pelo direito penal.
2. Implicações à Capacidade de Discernimento à Prática do Crime.
Estamos convictos que adolescência estende-se da puberdade, cujo aparecimento varia em torno dos 12 anos até aos 17 anos e, é uma fase em que os hormônios aparecem e mudam o comportamento, a docilidade da criança, dando lugar a atitudes rudes e contestatárias que permite o registo do atropelo cruel e sem dor, dos mais elementares valores morais, provocando assim à violência.(9) Tal como diz “Caeiro”(10), as fases sucessivas do desenvolvimento psicológico do indivíduo reflecte-se de forma bem saliente na criminalidade, sendo que cada idade tem a sua delinquência específica. Ao carácter falta firmeza indispensável para resistir à tentação e o optimismo juvenil possa atenuar o receio de uma possível atenuação. Mas, no entanto, o autor vai mais longe, na medida em que reafirma que os indivíduos novos reagem com relativa facilidade contra qualquer provocação, servindo-se de meios violentos, no sentido em que a afirmação brutal pela força física é um dos motivos principais deste delito que, nos menores é o segundo em frequência, descrevendo as fases do crime em quatro, sendo que dos 10 aos 18 anos a primeira fase, dos 18 aos 30 anos a segunda, dos 30 aos 45 anos a terceira e dos 45 anos de idade em diante a quarta e última fase.
Entretanto, a capacidade de discernimento tem sido um dos maiores problemas em sede da responsabilização criminal de um indivíduo que tenha praticado crime. O sistema penal angolano desde sempre mergulhou na linhagem da inimputabilidade dos agentes cuja conduta embora tipicamente reprimível, em razão da sua idade não lhe deve ser aplicado qualquer pena privativa de liberdade. Entretanto, figura no artigo 109.º do Código Penal de 1886, a exclusão da responsabilidade criminal do menor de 16 anos de idade, situação transversal e vivamente observado a par do artigo 17.º, nº 1 do novo Código Penal angolano ora aprovado a 11 de Novembro de 2020, no qual só devem ser submetidos a responsabilidade penal os indivíduos que tenham idade igual ou superior a 16 anos, leitura que transcende do artigo 108.º do Código de 1886, na medida em que todos aqueles que tiverem a idade inferior a 16 anos, continuam sendo submetidos à jurisdição dos Tribunais de menores, podendo em relação a eles ser tomadas medidas de assistência, educação ou correcção, tal como prevê o artigo 109.º do código já citado, realidade também assente no disposto no ponto nº 2 do artigo 17.º do novo Código Penal, sem descurar dos fundamentos constante na Lei dos julgados de menores, na lógica de que tais medidas dispõem da finalidade de defesa dos direitos e a salvaguarda da garantia, integridade física e moral do menor e a sua reintegração no meio familiar e na comunidade.(11)
No entanto, a par da sensibilidade do legislador ordinário no que toca ao processo de criação de leis face o contexto histórico e da realidade em que deve ser aplicada, com destaque a reforma da justiça em Angola, no âmbito da hermenêutica jurídica subjacente a imputabilidade criminal de determinados agentes do crime, este por sua vez e em função da consagração do elemento legal descartou a possibilidade de responsabilizar outros agentes que embora perpetrem factos tipicamente ilícitos já mas são chamados a responsabilidade penal. Isto é, catapultando-lhes a sua inimputabilidade em razão da idade e capacidade cognitiva, sustentada na maior parte pela ideia da necessidade do acompanhamento familiar e a falta de discernimento do bem e do mal, realidade esta que pensamos ser reapreciada, a fim de se ajustar ao novo paradigma decorrente da globalização e o actual contesto social, tendo em atenção a vontade criminosa que arrasta-se pela intenção de materializar o seu próprio pensamento, que em muitos casos a sua própria desistência torna-se irreversível, fruto do impulso de querer apresentar-se capaz e atormentador diante da vitima (seu semelhante), apresentando assim uma conduta desleal que caminha em desconforto e desconformidade com os cânones legais, colocando em situação de perigo a integridade física de indivíduos que em muitos casos venham a ser maior.
3. A Reforma do Código Penal de 1886.
O Código Penal, actualmente vigente em Angola e que deixará de vigorar no corrente mês de Fevereiro do presente ano de 2021, data do longínquo ano de 1886, aprovado pelo regime colonial português e implementado em Angola, enquanto Província Ultramarina de Portugal, ao longo de três séculos tem sido o eixo de todo o Sistema Jurídico-Penal Angolano, cuja sistemática compreende a Lei Constitucional e diversas leis ordinárias em matéria penal. Com efeito, o Sistema Jurídico-Penal é o mais lento a autoregenerar-se. Pois, conhecem-se poucos momentos, ou mesmo só muito pontuais, em que sofreu alterações, sendo de descartar qualquer reforma nesse sentido. Por outro lado, segundo o relatório da Comissão Técnica para a reforma Global do Direito e a publicação de um Código Penal da República de Angola, iniciada em 2004, as alterações introduzidas ao Código Penal não foram, nem de longe, nem de perto suficiente para impedir o desfasamento quer da parte geral, quer ainda mais, da parte especial do código de 1886 com o actual contexto social, económico e político, com o ideário que informa a sociedade angolana, com a maior complexidade do fenómeno criminal dos nossos dias e as formas de lhe fazer frente.(12)
Assim, há várias razões para considerar a reforma do Código Penal como uma das mais importantes no sistema jurídico angolano a par das reformas e alterações constitucionais. É a legislação comum ou principal de todo o Sistema Jurídico-Penal angolano, que trata de tutelar os valores fundamentais da sociedade sem os quais esta dificilmente sobreviveria. É uma legislação com um grau de absolutismo tal que por si só, se tem tornado perigosa pelas lacunas que regista e pelos desajustamentos em relação à nova realidade social.
Assim, considerando a complexidade do Ordenamento Jurídico-penal e, na sequência da referida reforma que traz consigo, não só na actualização dos preceitos normativos, mas também da tipificação e criminalização de outros comportamentos que carecem de tutela penal, torna-se necessário não só a divulgação deste instrumento jurídico, mas sobretudo na harmonização dos respectivos termos, a fim de garantir a homogeneidade e coerência da comunicação entre os especialistas da área, contando, que é através do discurso que os profissionais ligados ao aparelho judicial realizam a administração da justiça. Assim, a harmonização dos termos que ocorrem no discurso jurídico-penal passa indispensavelmente pela criação de recursos terminológicos, visando à estabilidade da terminologia do Direito Penal.(13)
Dos fundamentos subscritos e, em razão da análise em apreço subjacente, entendemos ser um grande avanço perspectivado em sede do figurino jurídico angolano, tendo em atenção à tendência evolutiva da sociedade, partindo desde o comportamento do próprio indivíduo enquanto ser social ao real papel das instituições que velam pela aplicação de leis, sua implementação e execução. Ora, entendemos que a reforma do código de 1886 chegou no momento oportuno pela introdução de um novo código penal, porque é chegado a ora e o momento de adaptarmos a evolução comportamental ao ritmo penal. Isto é, sancionar a conduta do indivíduo em função da natureza do crime por ele cometido.
A par deste desiderato, louvamos a emergência da introdução da Lei n.º 38/20 de 11 de Novembro (Lei que aprova o Código Penal Angolano), que observando pela globalização versada não apenas pela dinâmica das TIC influenciadora do domínio de actuações criminais, assim como o actual contexto político, social, cultural e económico do país, mergulhado desde a sua própria soberania e independência alcançada a 11 de Novembro de 1975, na medida em que a substituição do Código de 1886 trouxe maior abertura na salvaguarda dos bens jurídicos tutelados, partindo da gestão da coisa pública aos diferentes afazeres que de qualquer modo podem pôr em causa a sã convivência social e o respeito pelas demais instituições do Estado assente na prossecução e interesse dos fins gerais e específicos das comunidades.
Ora, com a intervenção do novo diploma legal cuja versatilidade é meramente penal, os nossos olhos inclinam-se na observância do instituto do menor em idade penal abaixo de 16 anos, com os itens posteriormente adversos.
4. Análise Sobre o Transversal Posicionamento Legal da Idade Penal Juvenil em Angola.
Em sede da reforma da justiça penal em Angola, no que toca a necessidade da substituição do Código Penal de 1886 ao novo Código Penal, tendo em conta às alterações adjacente aos novos tipos legais de crimes e a revisão de molduras penais vigente no código de 1886 no qual o actual legislador ordinário angolano achou conveniente introduzir uma nova realidade em substituição da antiga, pelo facto das penas previstas no código de 1886 em certos casos não corresponder a pretensão de resocialização do agente, sua limitação e abstenção da conduta criminosa. Atento aos factos, a conjuntura social e a evolução criminal, cremos que, não obstante o grande passo alcançado por Angola no mundo jurídico, isto é, pela introdução de um novo Código Penal que visa agravar as penas privativas de liberdade e medidas de segurança em torno de novas qualificações que se revestem ao paradigma social actual, entendemos ser inconcebível manter-se a idade penal juvenil de 16 anos. Pelo que, este seria o momento ideal do legislador ordinário repensar sobre a necessidade de reduzir a idade penal juvenil em Angola no sentido em que hoje por hoje em todas as áreas do território nacional (províncias, Municípios, Distritos e Vilas), se tem registado que boa parte dos crimes que ferem a moral pública e a sã convivência social são praticados por indivíduos com idades inferior a 16 anos, situação esta que deixa-nos bastante aterrorizados e preocupados e, lava-nos a questionar sobre o real impacto e papel do Estado e dos seus órgãos na criação e garantia de condições sociais de segurança na vida dos cidadãos, tal como versa os artigos 35.º nº 7 e 56.º ambos da CRA”, (14) bem como, o verdadeiro papel e contributo da própria família na sociedade com vista a mitigar tais actos, no sentido em que é entendida como a instituição que une os indivíduos num grupo e que coopera para a prossecução de um objectivo comum que consiste na criação e educação das crianças nascidas no seu seio”.(15)
Ora, estes indivíduos (menores de 16 anos), “que ainda não são adultos, mas que já deixaram de ser crianças, tal como defende “Pedro Moura Ferreira” (16), por gozarem de protecção legal especial e estarem isentos da responsabilidade criminal em razão da sua inimputabilidade e vício de menoridade, sem descurar do previsto no artigo 46.º da referida lei, não medem esforços na perpetração dos seus actos e em muitos casos acabam ceifando vidas alheias, colocando em total perigo o direito fundamental por excelência de qualquer cidadão previsto no artigo 30.º da CRA.
Este pormenor tem sido análise de várias questões por parte dos diferentes membros que integram a sociedade civil e não só, razão pela qual, atento a dinâmica jurídica, tivemos à amabilidade de efectuar um estudo a volta deste desiderato que no nosso entender carecia de uma profunda reflexão aliada a nova onda de criminalidade perpetrada por estes indivíduos.
5. Visão Adversa ao Espírito do Legislador Ordinário à Luz do Novo Código Penal.
Nota-se actualmente uma extrema facilidade e vontade criminosa por parte de indivíduos de vários estratos sociais, que culminam com a exteriorização material de tais vontades e principalmente de menores que em função da sua idade e benefícios legais não obstam a prática de tais condutas. Porém, é imperioso que se descarta a ausência de discernimento entre o bem e o mal na prática de crime por parte dos indivíduos desta faixa etária, razão pela qual defendemos que o legislador ordinário angolano no âmbito do processo de elaboração deste novo Código Penal cujo objectivo primordial assenta no reajuste e implementação de novas qualificações penais que visam adaptar-se a nova conduta humana em função novo contexto social pelas razões acima expostas e dos novos modos operandos de cometimento de crimes, deveria acautelar a posição dos menores inimputáveis em razão da idade, tornando- lhes assim imputáveis do ponto de vista da responsabilidade criminal, havendo assim a necessidade de se reajustar a idade penal juvenil, passando de 16 para 14 anos de idade em diante. Esta ideia baseia-se apenas na responsabilização dos menores com idades compreendidas entre os 14 e 15 anos, visto que actualmente muitos destes se encontram enquadrados em associações criminosas, dando lugar em certas ocasiões a co-autoria material e não só, representando um elevado índice de perigosidade social e contribuindo na inobservância da paz e sossego no interior das comunidades. Porém, defendemos ainda que no prisma da evolução criminal por parte destes agentes em menor idade penal, à luz da nova realidade penal angolana seria sensato se o legislador ordinário submetesse apenas ao julgado de menores, os indivíduos com idades compreendidas abaixo de 14 anos.
Na senda da nossa linhagem de pensamento subjacente ao espírito do legislador ordinário angolano que se arrasta da legislação penal portuguesa, entendemos que, na redução da idade penal juvenil, o legislador ao tipificar a idade penal juvenil de 14 anos, levaria em conta um conjunto de situações que de qualquer maneira não viessem a comprometer a vida futura do criminoso, passando desde a pena aplicável a outras circunstâncias consideradas atenuantes.
Grosso modo, supomos que, existindo um crime praticado por indivíduo com idade penal (14 anos) suficientemente comprovado, acusado e pronunciado, este por sua vez não lhe pode ser aplicado uma pena de prisão superior a 10 anos. O que significa que, aplicando-lhe uma pena de 8 anos de prisão maior de um crime por ele cometido, até ao cumprimento integral da pena ou da metade da pena face a observância das obrigações impostas aos requisitos legais que lhe permite beneficiar da liberdade condicional, este por sua vez venha a gozar da sua liberdade após atingir a maioridade civil prevista no artigo 24.º da CRA, pressupondo a idade com maior convicção do discernimento do bem e do mal e, da valoração e impacto da vida e das relações em sociedade, bem como da protecção dos bens e interesses jurídicos tutelados pelas instâncias de direito. Pelo quê, só desta forma observaremos a controversa da tendência criminal praticada por estes indivíduos. Estamos convictos de que a extinção da criminalidade juvenil não passa simplesmente pela responsabilidade criminal, mas defendemos que seria necessário puni-los para redução de tais condutas que comprometem as futuras responsabilidades paternais; tal como o resgate dos valores sociais (moral, cívico e cultural).
Conclusão
Dos argumentos a cima exposto inerente ao desencadear da análise que se impõe sobre a idade penal juvenil em Angola, conclui-se que, não obstante o grande e valioso impacto jurídico do legislador ordinário angolano no âmbito interno e internacional vocacionado pela elaboração e introdução de um Código Penal que nalguns casos se adapta a própria realidade social criminal, pese embora a sua felicidade catapultar-se nesta vertente; entendemos por outro lado ser infeliz, na medida em que abdicou-se de analisar o problema da idade penal juvenil. Isto é, herdando assim de maneira transversal uma realidade visivelmente A Quo que ao nosso entender achamos não ser ideal face a dinâmica e evolução comportamental ao novo paradigma social cuja dimensão criminal é ligeiramente repugnante e notório no seio de indivíduos considerados inimputáveis e exclusos da responsabilidade criminal. Portanto, entendemos que tal desiderato seria realmente ultrapassado, se na eventualidade a idade penal juvenil à luz do novo código fosse reduzida de acordo a idade a cima referida.
Nicolau Dinis Candandilo, Licenciado em Direito pela Faculdade de Direito Da Universidade Kimpa Vita e Defensor Oficioso do Tribunal Provincial do Uíge.
Notas de rodapé:
(1) TCHIYOMBE, José Hindengwa; TCHIKOMO, Evaristo Augusto – Sumários Desenvolvidos de Introdução ao Estudo do Direito. 1ª Edição. Luanda: Mayamba. 2019, p.155.
(2) VELOSO, Maria da Ressurreição da Silva – Criminalidade em Angola na era da paz, com peculiar relevância da criminalidade juvenil. Dissertação apresentada para obtenção do Grau de Mestre em Direito. Especialidade em Ciências Jurídico-Criminais. Lisboa. 2014, p.27.
(3) JUSTO, António Santos – Introdução ao Estudo do Direito. 6ª Edição. Coimbra. 2012, p.15.
(4) Cfr. Arts. 30.º e 31.º Ambos da Constituição Angolana de 2010.
(5) Cfr. Art. 70.º Do Código Civil Angolano.
(6) FERREIRA, Pedro Moura – Delinquência juvenil, família e escola. Análise Social. Vol. XXXII. 1997, p. 914.
(7) NEGREIROS, Jorge – Delinquências juvenis: Trajectórias, Intervenção e Prevenção. Porto: Ed. Livpsic. 2008, p. 12.
(8) PIMENTA, Maria da Encarnação – Eventuais Causas e Consequências da delinquência em Angola: Modelos de delinquência. Lisboa: Calçada das Letras. 2010, p. 33.
(9) KUNDONGENDE, João Da Cruz – Crise e Resgate dos Valores Morais, Cívicos e Culturais na Sociedade Angolana. Huambo: CERETEC. 2013, pp. 46 e 69.
(10) MATTA, Caeiro da – Direito Criminal Português. 1ª Edição. Vol. I. Coimbra: F. França Amado. 1911, pp. 79-80.
(11) Cfr. Art. 37.º Da Lei nº 9 / 96 de 19 de Abril (Lei Sobre o Julgado de Menores).
(12) Ministério da Justiça: www.minjusdh.gov.ao/download.aspx?id=444&tipo=legislação.
(13) ALMEIDA, José Sebastião de – Dissertação de Mestrado em Terminologia e Gestão Informática de Especialidade. Lisboa. Março de 2018, p.p. 14-15.
(14) Cfr. Art. 56.º Da constituição da República de Angola de 2010.
(15) VIEGAS, Fátima – O papel da família e da sociedade civil na construção de uma nova mentalidade. In: Estudos e opiniões, Revista n.º 6. Julho-Dezembro. 2010, p.37.
(16) FERREIRA, Pedro Moura. Op. Cit., p. 914.
Referências Bibliográficas
Constituição da República de Angola de 2010
Lei nº 9 / 96 de 19 de Abril (Lei Sobre o Julgado de Menores). Código Civil Angolano
ALMEIDA, José Sebastião de – Dissertação de Mestrado em Terminologia e Gestão Informática de Especialidade. Lisboa. Março de 2018.
FERREIRA, Pedro Moura – Delinquência juvenil, família e escola. Análise Social. Vol.
XXXII. 1997.
JUSTO, António Santos – Introdução ao Estudo do Direito. 6ª Edição. Coimbra. 2012. KUNDONGENDE, João Da Cruz – Crise e Resgate dos Valores Morais, Cívicos e Culturais na Sociedade Angolana. Huambo: CERETEC. 2013.
MARTA, Caeiro da – Direito Criminal Português. 1ª Edição. Vol. I. Coimbra: F. França Amado. 1911.
NEGREIROS, Jorge – Delinquências juvenis: Trajectórias, Intervenção e Prevenção. Porto: Ed. Livpsic. 2008.
PIMENTA, Maria da Encarnação – Eventuais Causas e Consequências da delinquência em Angola: Modelos de delinquência. Lisboa: Calçada das Letras. 2010.
TCHIYOMBE, José Hindengwa; TCHIKOMO, Evaristo Augusto – Sumários Desenvolvidos de Introdução ao Estudo do Direito. 1ª Edição. Luanda: Mayamba. 2019.
VELOSO, Maria da Ressurreição da Silva – Criminalidade em Angola na era da paz, com peculiar relevância da criminalidade juvenil. Dissertação apresentada para obtenção do Grau de Mestre em Direito. Especialidade em Ciências Jurídico-Criminais. Lisboa. 2014.
VIEGAS, Fátima – O papel da família e da sociedade civil na construção de uma nova mentalidade. In: Estudos e opiniões, Revista n.º 6. Julho-Dezembro. 2010.
Www.minjusdh.gov.ao/download.aspx?id=444&tipo=legislação.