Por: Valdano Afonso
Introdução
O problema da determinação das fontes de Direito é o problema de saber como certos conteúdos normativos adquirem juridicidade, isto é, como se tornam historicamente vigentes como normas jurídicas, como Direito.
A doutrina jurídica tradicional define fontes de Direito como o modo de formação ou de revelação do direito (objectivo).
Entende-se por jurisprudência o “conjunto das decisões em que se exprime a orientação seguida pelos tribunais ao julgarem os casos concretos que lhes são submetidos. (Sobre o sistema jurisdicional angolano, cfr. artigos 174.º a 183.º todos da Constituição da República de Angola – CRA aprovada em 2010, a Lei n.º 2/15, de 2 de Fevereiro – Lei Orgânica Sobre a Organização e Funcionamento dos Tribunais da Jurisdição Comum (lei que revogou a Lei n.º 18/88, de 31 de Dezembro – Lei do Sistema Unificado de Justiça) e a Lei n.º 1/16, de 10 de Fevereiro – Lei Orgânica dos Tribunais da Relação).
Dos Assentos
Os assentos (fontes mediatas de Direito) são decisões proferidas pelo Tribunal Supremo em sede de Recurso para o Plenário para efeitos de Uniformização de Jurisprudência”, ou comumente designado por “Recurso para o Tribunal Pleno”.
«O carácter normativo dos assentos é, na verdade, irrecusável, face ao disposto no artigo 2.º do Código Civil Angolano, segundo o qual “Nos casos declarados na lei, podem os tribunais fixar, por meio de assentos, doutrina com força obrigatória geral”.
Os assentos interpretativos (espécie de assentos sobre os quais se centra a nossa abordagem com vista a consecução de uma resposta certa e cabal à questão suso formulada e que dá título ao nosso texto), – fixam o sentido juridicamente relevante de um preceito preexistente e com ele a partir daí se confundem. A norma a que se dirige tal tipo de assento, de norma de interpretação variável evolui, por força da valoração jurídica sobreposta que aquele consequencia, a norma de interpretação estável ou, pelo menos, mais estável (o assento, como norma jurídica, também é susceptível de interpretação). A norma visada sofre, por via do assento interpretativo, profunda recomposição: é uma nova norma, deste modo recomposta, que passa a existir no direito positivo. Há, pois, como que uma fusão entre a norma atingida e a norma do assento que a modula.
Com efeito, nesta linha de entendimento, há-de afirmar-se que os assentos se apresentam com carácter prescritivo, constituindo verdadeiras normas jurídicas com o valor de ‘quaisquer outras normas do sistema’, revestidas de carácter imperativo e força obrigatória geral, isto é, obrigando não apenas os tribunais, mas todas as restantes autoridades, a comunidade jurídica na sua expressão global. No dizer denso e impressivo de CASTANHEIRA NEVES, constituem os assentos “uma prescrição jurídica (imperativo ou critério normativo-jurídico obrigatório) que se constitui no modo de uma norma geral e abstracta, proposta à predeterminação normativa de uma aplicação futura, susceptível de garantir a segurança e a igualdade jurídicas, e que não só se impõe com a força ou a eficácia de uma vinculação normativa universal, como se reconhece legalmente com o carácter de fonte de direito.»
Postas estas noções introdutórias, importa agora responder à questão ora formulada. Nesta conformidade, dizer que, contrariamente ao que (infelizmente) se diz e até se ensina, dentro e fora das Faculdades de Direito em Angola, no nosso sistema jurídico os “Assentos” não representam o único caso em que a Jurisprudência funciona como fonte (mediata) de Direito, no sistema jurídico angolano, porquanto os Acórdãos do Tribunal Constitucional proferidos em sede dos processos de “Fiscalização Abstracta Sucessiva da Constitucionalidade, têm também este condão.
Estatui o n.º 1 do artigo 230.º da CRA que “O tribunal Constitucional aprecia e declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade de qualquer norma.” Por sua vez, o n.º 1 do artigo 231.º também da Lei Magna estabelece que “a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral produz efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional e determina a repristinação da norma que haja revogado”.
Posto isto, fácil se conclui que tal como os Assentos que se apresentam como verdadeiras fontes mediatas de direito e não como mera jurisprudência , ora porque se apresenta como fonte interpretativa, quando se limita a fixar o sentido e alcance de certa norma tida como ambígua, ou como uma fonte inovadora, quando preencha uma lacuna do sistema jurídico, os Acórdãos do Tribunal Constitucional proferidos em sede dos processos de “Fiscalização Abstracta Sucessiva da Constitucionalidade , são também fontes de Direito no âmbito da jurisprudência, e isto porque uma vez publicados tornam-se decisões judiciais vinculativas para o futuro, para os casos idênticos, vinculam outrossim todas as entidades, todos os tribunais (incluindo o próprio Tribunal Constitucional), assim como todos os cidadãos e demais pessoas jurídicas.
Vale contudo, realçar que, não obstante tais decisões jurídicas revestirem-se de juridicidade, não são actos legislativos, dado o facto de não dimanarem do exército do poder legiferante.